quinta-feira

Obrigado a todos.Valeu a pena.

"Mayday". Daqui Tiago. "Boots" mudar o mundo.

Em retórica bem pensada, Tiago, na sua epístola, procura alertar a comunidade cristã para que vigie sobre si própria, no sentido de uma fidelidade a Deus. Que aquilo em que acreditam se manifeste nos seus actos: uma ortopraxis voltada para a ética e justiça social. Possivelmente escrita no final do século I, dirige-se às Doze Tribos, sendo que, mesmo sabendo que pode ser a diáspora toda, é também cada comunidade da diáspora. A falta de atenção aos pobres, o decréscimo da importância da Palavra na comunidade e a pouca expressão de comunidade fraterna dentro da Igreja, irrita solenemente Tiago e impeli-o a despertar as ekklesiai mais relaxadas. Sente-se uma saudade tipológica da comunidade de Jerusalém, como referência de mudança. É o cristianismo que lentamente ergue novo.

Uma casa onde todos sofrem e riem de alegria

É sabido que o sonho de O Chefe de Estado é conseguir angariar o maior número possível de forasteiros, desalojados, peregrinos, [refugiados não, porque isso dá status na ONU]… enfim, gente sem pedigree. Tão non sense como este Presidente tónhó, Pedro parece ter uma fixação por esta gente cuja vida parece um falhanço. E não é para menos. Gente que vive fora da pátria, fora de casa, perseguida por ser um je ne sais quoi, invoca bem a figura do Homem diferente de Nazaré.

Pedro, na sua primeira carta, em registo meio litúrgico meio exortativo, entusiasticamente, tece um louvor justificativo à condição desalojada dos cristãos dispersos. Apelando à justiça, reúne em casa os que participaram da ressurreição de Jesus. A alegria surge como resposta natural e paradoxal ao sofrimento. Noutro registo, o autor da II Carta de Pedro, pela solenidade do apelo à virtude, e numa apresentação de um esboço de compreensão do corpus bíblico, purifica o comportamento dos irmãos condenado uma possível gnose descomprometida. Em jeito de testamento espiritual, prepara a posterior memória de uma comunidade que se constrói.

quarta-feira

Paroikos

Uma das coisas mais apaixonantes na Prima de Pedro (vulgo: Primeira carta de S. Pedro), do meu ponto de vista, é a questão da terceira identidade dos cristãos que não são judeus nem pagãos. Os cristãos são os discípulos de Jesus, o Verbo de Deus que montou a sua tenda entre os homens (Jo 1, 14). Deste modo, julgo, não podemos buscar luz para essa identidade senão nas palavras do Jesus quando afirma não ser do mundo, do mesmo modo que aqueles que O acolhem também não o são.
Pedro abre a sua carta dirigindo-se aos eleitos estrangeiros já dispersos ou difundidos pelas províncias romanas da Ásia. A dispersão não é um tema novo, contudo, este termo, aplicado aos cristãos, reveste-se, verdadeiramente, de um novo significado. Se para os judeus a diáspora/dispersão é uma realidade posterior que olha com saudades para a terra prometida, para os cristãos, pelo contrário, é uma realidade de certa forma intrínseca, em dois sentidos. Primeiro, a dispersão é a primeira expansão da Igreja, um movimento que se deve a muitos motivos mas sobretudo ao mandato missionário do próprio Jesus. O segundo sentido, concentrado no termo estrangeiros - paroikos, certamente mais próximo às intenções do autor, reporta-se ao que acima dissemos, a nova identidade destes homens, como cristãos. Estes são estrangeiros porque discípulos de Jesus. Sendo estrangeiros estão fora das estruturas sociais às quais o cristianismo constitui uma alternativa. São marginais pela sua fé e vontade, mas ao mesmo tempo, paradoxalmente, eleitos por Deus para formarem um novo povo sob a égide de Cristo.
O cristianismo é a casa, a cidade, o país, mesmo a identidade dos cristãos. A comunidade dos eleitos constitui um povo novo, pertença de Deus apenas. O mal que antes era ser estrangeiro, paradoxalmente, torna-se o bem querido por Deus, estado de vida fecundo para a humanidade.

O Homem que não pode morrer

Começa por ser o escolhido pela comunidade, um entre outros para servir como diácono. Cheio de graça de poder e de prodígios. Ele era um pregador que andava a pregar nas sinagogas (isto revela que ainda não se tinha dado a cisão do cristianismo com o judaismo).
Quando ao mentir sobre a sua vida quiseram retirar a sua dignidade o seu rosto não se aparentava senão com um anjo. Estêvão é um homem com sabedoria pois conhecia a escritura e o seu sentido pois não a lia de modo aleatório ou fragmentário mas dando-lhe um sentido. Tem em si a coragem para afrontar os sacerdotes. Ele apresenta-se como profeta para aqueles que o acusavam, e pede o salto que outros conseguiram dar para coisas que pareciam pouco possíveis de acontecer.
Mas aqueles que reconheceram o seu rosto como o de um anjo(6,15), não reconhecem que a sua mensagem(7,53).
Este homem está por Deus pois é o próprio Deus que se lhe oferece a ver.
Estêvão acaba por neste texto dos actos revelar a presença de Paulo contra os cristãos. Mas mesmo apedrejado confiava no Senhor e permanece misericordioso como o seu Senhor.

Não pode morrer, somente pode descansar dos trabalhos da sua paixão, pois o céu lhe será atribuído como justiça.

O relato da eleição de Matias (Act 1, 15-26), para ocupar o lugar deixado por Judas, é, na sua globalidade, um bom exemplo da estratégia teológico-narrativa de Lucas.
O texto inicia-se com o discurso de Pedro a uma assembleia de cento e vinte irmãos que, ali, se encontrava reunida. É logo aqui que encontramos os primeiros traços da estratégia de Lucas. A comunidade é hierárquica, dirigida pelos apóstolos entre os quais se destaca, claro, Pedro. Facilmente se estabelece uma relação de paridade entre o número de irmãos presentes na assembleia e o número das tribos de Israel – cento e vinte irmãos, doze tribos. Esta ideia é ainda reforçada quando Pedro faz uma releitura do Antigo Testamento à luz dos acontecimentos presentes, relacionados com a traição de Judas e com o subsequente desenlace da sua história.
Há quem afirme que o narrador se serve de lendas que já correriam acerca da morte do traidor. De qualquer forma, e introdução dos dados acerca da morte de Judas, como uma realidade do conhecimento geral, assim como as referências topográficas é uma forma de dar força ao discurso, prólogo do que adiante acontecerá. Este primeiro grupo é o que há-de receber o Espírito no Pentecostes. Acontece, contudo, que o grupo dos apóstolos não está completo. Assim, servindo-se dos textos proféticos e dos salmos, Pedro pretende guiar a assembleia para uma decisão, o seu discurso é, senda que liga a história de Israel à história da assembleia reunida, visa a eleição, por parte de Deus, de um homem que venha completar o grupo, nos moldes deixados por Jesus.
Numa dinâmica que articula a acção divina e humana, a comunidade, segundo as linhas traçadas por Pedro, escolhe dois candidatos. Estes, homens rectos e justos, acompanharam Jesus desde o baptismo de João até à sua morte, sendo testemunhas da sua ressurreição, são José, chamado Barsabás, apelidado Justo e Matias. Deus cujo juízo é justo, por meio da sorte, elege Matias.
O narrador segue duas linhas no seu relato, a primeira é a do próprio relato e a sua história, a segunda a teologia por trás do relato. Neste texto, a imagem que transmite da comunidade, não se realçam as diferenças entre o povo da Antiga e o da Nova Alianças, é certo que, interiormente, se identificam as distinções mas, não é esse o objectivo do autor. O relato visa a unificação e a herança comum, prova disso é o próprio uso, num texto redigido em grego, de termos hebraicos e da sua subsequente tradução. Há pontes que tem que ser estabelecidas em dois sentidos. O primeiro é, certamente, o reportar a assembleia a Jesus. Este ponto é fulcral porque garante uma identidade. Os apóstolos são o vínculo directo entre Jesus e a assembleia, por isso a escolhe do substituto de Judas só pode ser levada a cabo por Deus, sem contudo ser alheia à comunidade. Assim, também, compreendem-se cabalmente as condições da escolha. O segundo é a inserção da nova comunidade na história do povo de Israel, arriscamos, na história da salvação que não acaba com a consumação da Antiga aliança, mas que se abre ao mundo.

A casa sofrida dos Paroikoi



Os Paroikoi, aos quais é destinada a primeira carta de Pedro, dão-nos a informação de que o cristianismo nascente dá-se de modo exterior à sociedade de então. Esta "falta de casa" como o próprio nome indica acaba por ser o que lhes concede a identidade. Aqui entra a pessoalidade como algo especifico deste grupo e que torna possível o individual, pois cada um pode ser o testemunha. A pedra que é rejeitada por tdos pode valer, porque Deus a faz valer.
A casa dos cristãos é topos e ethos porque Cristo a constitui assim e se não estão em Cristo não fazem parte desta casa, trata-se aqui de perceber o que é estar “em Cristo” 5,14.
A realidade do sofrimento era algo que estava presente nos paroikoi, devido às perseguições e mesmo ao seu estado marginal e obviamente no que se refere ao pecado.
Cristo aparece para os cistãos como modelo (4,1), e este sofrimento é apresentado paradoxalmente como uma experiência de graça e de Salvação (1,6-9).
Estes sofrimentos eram vividos na expectativa de da glória (1,11 e 4,13).
Em verdade o sofrimento descrito e proposto na 1ª carta de Pedro é a realidade que concede coesão aos paroikoi, pois orientando o seu sofrimento para o Senhor concedia-lhes força e coesão. O Espírito Santo seve-se destas realidades conflituosas e ofensivas para nos irmanar.

A Carta de Tiago

A Carta de Tiago

Na Carta de Tiago encontram-se muitas coisas acerca da prática cristã. Podemos mesmo chamar a carta de Tiago, “a carta das obras” porque se trata do comportamento cristão quotidiano.

Os destinatários desta Carta são “as doze tribos da Dispersão” (1,1) mas não seriam nem os judeus da emigração fora palestina, nem os cristãos em geral, dispersos pelo mundo. A designação de as doze tribos de Israel é simbólica. Seriam os judeo-Cristãos da Diáspora, embora sem excluir outros cristãos em contacto com Tiago. Foi escrito posterior ao ano 60 e o contexto seria um contexto da Síria.

Na carta de Tiago a fé é vista como um dinamismo que produz acções e que só é madura quando se exprime em actos concretos. Isto é claro no versículo 2,22. A carta de Tiago procura mostrar que a verdadeira sabedoria se exprime pelo comportamento que temos diante das situações. Podemos ver este aspecto no versículo 3,13 “existe alguém entre vós que seja sábio e entendido? Mostre, então, pelo seu bom procedimento, que as suas obras estão repassadas da mansidão própria da sabedoria”.

Na carta de Tiago podemos ver uma relação íntima do crescimento biológico com a maduração psicológica, humana e espiritual. A maturidade humana baseia-se na capacidade de governar a própria vida e entrar em relação com os outros de uma forma responsável. Podemos dizer que a pessoa madura é a pessoa que sabe enfrentar o dia a dia. Sabe encaminhar as emoções e tem um equilíbrio no seu agir.

O acolhimento de sabedoria do alto/Deus é um aspecto imprescindível na carta de Tiago. Podemos ver isto nos versículos 3,16-18. “Pois, onde há inveja e espírito faccioso também há perturbação e todo o género de obras más. Mas a sabedoria que vem do alto é, em primeiro lugar, pura; depois, é pacífica, indulgente, dócil, cheia de misericórdia e de bons frutos, imparcial, sem hipocrisia; e é com a paz que uma colheita de justiça é semeada pelos obreiros da paz”. Uma colheita de Justiça é a santidade, a conformidade com Deus e a sua palavra, manifestada nas obras, como reflexo de autêntica sabedoria.

Daivadas Vazhappillil Thomas

Tiago é conflituoso

A carta de Tiago é uma carta que pertence ao grupo das cartas católicas pois não tem nenhum endereço concreto. Apesar de referir que a carta é destinada às doze tribos em diáspora, o seu objectivo não é só uma comunidade mas sim tem uma clara pretensão universal, ou seja, à toda a Igreja que a escute ou a leia. Datado de data posterior ao ano 70, o primeiro registo de acolhimento desta carta vem de Alexandria.
Esta carta não se trata de uma carta voltada para os temas teológicos puros mas sim para a vida concreta dos cristãos com os seus problemas concretos. Trata-se de uma carta pastoral com o intuito de inculcar um ensinamento e isso vê-se bem através do esquema utilizado por Tiago na construção dos vários andamentos explícitos na sua carta, pois fá-los andar a um ritmo binário colocando no final de cada andamento uma máxima. Este texto é um texto exortativo de caris moral mas profundamente animado pela fé.
A exposição clara da relação da fé com as obras em 2, 14-26 é uma das principais razões para colidir com a perspectiva Luterana protestante, tendo sido aí um embaraço. Esta deve ser nossa preocupação, pois compreendendo o texto temos a obrigação de o expor na verdade não obstante as questões que ele nos coloca. É obvio que dar o passo da aceitação do texto não está nas nossas mãos mas o anúncio da verdade nele contido pode ser caminho para com os nossos irmãos separados.

A primeira carta de Pedro

A Primeira Carta de Pedro

É um dos escritos mais importantes do NT, onde podemos ver uma teologia de sofrimento. Podemos afirmar que o tema de sofrimento é importante neste texto por causa da própria condição da comunidade. Neste texto os cristão encontram-se na diáspora. Os Cristãos são“Paroikos (1,1)”. Eles são sem estatuto. Esta primeira carta de Pedro dá estatuto, identidade aos cristãos de diáspora. A Primeira Carta de Pedro diz que cristãos têm uma família, uma casa. Nesta carta os que estão fora da sua pátria, não conhecem a língua e a cultura do país são agora com uma identidade. A identidade vem a partir da vida que os cristãos vivem.

Nesta carta, há um aprofundamento de sofrimento e diz que como é que o sofrimento pode ser vivida na alegria. Fazer dele um caminho é importante nesta carta. O sofrimento é sofrimento e a alegria é a alegria. Mas há uma conciliação. É em Jesus. Há 3 textos que fala acerca disso. Eles são 1,6-9; 3,13-19; e 4,12-19.

Os cristãos são chamados a viver a sua vida à luz da vida de Cristo, e a considerar os seus sofrimentos como participação e imitação das provações por que Ele passou, alegrando-se nisso. O sofrimento é breve e passageiro, ao passo que a glória esperada é eterna e superior. É preciso de viver vigiando e orando no meio desta tribulação, tendo amor para com todos. Portanto, o cristão é chamado também a amar os perseguidores. É preferível sofrer e ser atacado por fazer o bem do que por fazer o mal. Tudo isto é possível porque Cristo já o fez por nós, e isso é experimentado na fé. Podemos dizer que nesta carta há uma liberdade individual que vem de profunda vivencial da fé cristã.

Daivadas Vazhappillil Thomas

Segunda Carta de Pedro

Segunda Carta de Pedro
O autor desta carta apresenta-se como “Simão Pedro, servo e Apóstolo de Jesus Cristo” (1,1) e testemunha da Transfiguração de Jesus na montanha (1,16). Apesar disso, há muitas interrogações sobre autenticidade. Aqui são raras as citações do AT, ao contrário da 1Pedro. Sem dúvida podemos dizer que o hipotético redactor da Carta não queria substituir Pedro, mas fazer justiça à autenticidade da mensagem de apóstolo Pedro sob a inspiração do Espírito santo. A carta poderia ter sido escrita entre os anos 80-90. O local de redacção poderia ser Roma.
Segunda carta de Pedro é diferente da Primeira Carta de Pedro. Na primeira carta de Pedro o tema de perseguição é muito preponderante. Mas nesta carta não se percebe a perseguição que viviam os cristãos. Os temas fundamentais desta carta são: a segunda vinda do Senhor (1,16), definida como misericordiosa (3,4.8-10.15), mas que vai trazer uma mudança radical no cosmos; a importância do Conhecimento religioso.etc. Nesta carta os assuntos como exortação à perseverança na fé, denúncia dos falsos mestres são muito sublinhados.
Nesta carta podemos ver muito claramente que Jesus é o modelo a imitar, Ele é objecto de conhecimento. Nós podemos ver este aspecto muito claramente no 1,5-8.
“Por este motivo é que, da vossa parte, deveis pôr todo o empenho em juntar à vossa fé a virtude; à virtude o conhecimento; ao conhecimento a temperança; à temperança a paciência; à paciência a piedade; à piedade o amor aos irmãos; e ao amor aos irmãos a caridade. Se tiverdes estas virtudes e elas forem crescendo em vós, não ficareis inactivos nem estéreis, relativamente ao conhecimento de Nosso Senhor Jesus Cristo.” Podemos dizer que é através de virtudes é que alcançamos o conhecimento de Cristo.
Daivadas Vazhappillil Thomas

Continuação da reflexão em 1P e 2P

Na reflexão anterior, fizemos um breve estudo entra 1P e 2P. Nesta segunda fase da reflexão, queremos fazer uma breve analise entra 1P, 10-12 e 2P1,16-20, ou seja, como un texto original (1P1,10-12) ajuda-nos a pereceber um texto tão difícil de (2P1,16-21)? Não se trata de abordar todas as relações entra a segunda e a primeira de Pedro, mas de reconhecer a primeira de Pedro pela segunda (2P 3,1) e ver de facto se há um qualquer parentage em algumas passagens de ambos textos. Mas já posso afirmar que o texto muito difícil de 2P 1, 16-21 só se percebe claramente à luz de 1P 1, 10-12.
O texto de 1P 1, 10-12 mostra-nos que a profecia está ao serviço do Evangelho. Esta referência bíblica é fácil a perceber, pois, representa uma convicção no cristianismo primitivo: os profeats antigos preparam a proclamação da Boa Nova por Jesus Cristo. Trata-se da salvação em Jesus (1P 1, 3-9) como realidade preciosa mas ainda ambigu. os elementos que constituem esta salvação em Jesus são a generosidade divina "graça", a centralidade da Pessoa d da obra de Cristo (sofrimentos e glórias). A missão e a condições dos profetas tem um lugar central nestes três versículos. Falam de uma graça que não percebem, mas Jesus é a chave que abre o sentido (Lc 24, 35; Ac 3, 18). Este texto tem uma tripla originalidade
1) Os profetas percebiam que anunciam uma realisação messiánica que comportava sofrimento e glória;
2) estavam conscientes de uma profundeza que os ultrapassava;
3) como uma graça e uma limitação inultrapassável, sabiam que esta passagem não estava para eles mas para as gerações futuras, os destinatários do Evangelho.
o 1P 1, 10-12 é a preparação do uso massivo do Antigo Testamento, mas a sua leitura será estrictamente cristológica. A primeira carta de Pedro é um dos livros do Novo Testamento que contém mais citações do Antigo Testamento ou que faz referência ao Antigo Testamento.
A firmeza do Evangelho e da profecia encontram-se em 2 P 1, 16-21. a segunda de Pedro parece ser difícil, pois impõe decisões delicadas. podmos dividir a em duas partes, 16-18 e 19-21, ligadas entra elas por "e" e eventualmente pela comparação "mais firme". A unidade do conjunto é sustentada por um tema comum, a Palavra, uma palavra transmitida pelos apóstolos (1,16) e a palavra profética (1,19). Os destinatários, o "nós" apostólico, liga o rela a Cristo, 1, 16-18, e a afirmação relativa `na exelência da profecia, 1, 19-21, e neste segundo "nós", um alargamento da comunidade cristã.
alguns elementos levam-nos a fazer uma compração entra 1P e 2P:
1) O testemunho apostólico (1, 16-18),
2) A palavra profética (1, 19.21).
Além de algumas diferenças notáveis, existem pontos de contacto entra as duas cartas: a valorisação da "palavra profética" (inspiração profética entra 1P 1, 10-11 e 2 P 1, 21); Conclusão, o conjunto do capítulo 1 de 2P, na sua estructura e desenvolvimento das ideias, é inspirado de 1P 1,2-12). Há uma familiaridade entra o autor de 2P e 1P, apesar das difrenças.
assim, o 2P 1, 16-21 parece ser, como o 1 P 1, 10-12, uma secção consagrada ao fundamento da fé, a Palavra relativa a Cristo.
Max ATANGA

Historiografia nos Actos (elementos dispersos)

O livro dos Actos apresenta uma história poética, sem deixar de ter elementos de uma história documentaria e de uma história explicativa. Parto da tipologia de Paul Ricoeur para tentar justificar que Actos essencial e estruturalmente é uma história que relê o passado em relato dos fundadores para construir uma identidade, uma identidade cristã que assenta na pessoa de Cristo e paulatinamente consciencializa-se nas comunidades presentes no eixo geográfico, cultural, religioso Jerusalém – Roma.

O símbolo torna-se um instrumento usado para aprofundar a realidade que é sintetizada na história. Mas assim parece-se correr o risco de tornar a história algo imaginário e hipotético. Não, o símbolo apresenta-se como apelo à vivência de um passado actualizado no presente. O anuncio de Jesus ganha actualidade na síntese dos relatos da vida das várias personagens, nas suas relações e no seu contexto abrindo um caminho de densidade clarificadora, ou melhor, faz ver o percurso e interpela a um percurso de sensibilidade à consciência cristã. Um exemplo claro é o caminho que Pedro faz nos Actos para acolher a nova realidade de ser-se de Cristo (Cristão) ao aceitar Cornélio. Este exemplo leva-nos à parcialidade do autor que define e sintetiza a realidade com uma atitude contemplativa onde se reconstrói a história. O autor parte da realidade e nela encontra um objecto que associada ao seu dizer encontra o seu sentido.

Actos é história porque apresenta os realia. Estes são elementos não só dão credibilidade à história narrada mas são parte integrante desde percurso que leva o livro de Actos ser história.

Carta de Tiago - exortação energética

A carta de Tiago é uma exortação enérgica e indicia as dificuldades das comunidades “doze tribos da Dispersão”. Com a sua pena animada pela fraternidade “meus irmãos” exorta vivamente à fé com indicações claras e precisas utilizando imagens fortes que não deixam qualquer dúvida da intenção do autor. É desconcertante a ausência quase completa de Jesus, apenas presente no início da carta a em 2, 1.

Apresenta a atitude de como deve um cristão proceder neste momento de provação e dificuldade. Das atitudes presentes na carta destaco a fé com que se pede a sabedoria a Deus; o transitório da vida associado à condição social (erva de murcha e morre); a perseverança em Deus nas tentações; aceitar com mansidão a Palavra; dominar a ira; refrear a língua (imagem do cavalo e do leme do barco), a fé sem obras não existe; não julgar os outros, Deus é o garante de tudo.

Encontramos nesta carta algumas tensões claras com a condição dos pobres e dos ricos, (1, 9-12; 5, 1-6), os problemas de liderança nas comunidades (4, 1-3). Os temas da fé relacionada com as obras, com a confiança contra a presunção e com a petição estão bem presentes qual como a sabedoria relacionada com a mansidão, advertência constante pelas indicações pessoais e comunitárias ao cuidado no trato.

A carta apresenta-se como um barómetro da fé, advertência à situação das comunidades e ânimo na confiança através da oração.

Timóteo e a sua função

Timóteo surge nos Actos depois da discussão de Paulo e Barnabé no início da segunda viagem missionária de Paulo. Timóteo aparece-nos pontualmente na segunda e terceira viagens missionárias de Paulo desempenhando um papel de suporte nas comunidades tal com Silas, que se nos apresenta como o companheiro de Paulo depois da discussão, nos momentos onde Paulo é ameaçado e é forçado a seguir outras direcções. Podemos considerar que Timóteo é a ponte para Paulo ir a Atenas anunciar a pessoa de Jesus, já que é na referência ao pai de Timóteo, que é grego, fala-se pela primeira vez de gregos nas viagens missionárias de Paulo.

Timóteo também é testemunha da intenção de Paulo ir a Roma. Paulo sempre contou com Timóteo para se disponibilizar mais à pregação (18,5). É neste contexto, onde se funda a Igreja de Corinto que Paulo ao ser rejeitado pelos judeus afirma: “de futuro, dirigir-me-ei aos pagãos”(18,6).

Silas e Timóteo apresentam-se gradualmente mais juntos devido à necessidade de defender/proteger Paulo das mãos dos judeus e de outros que se sentem afrontados com a pregação e a ousadia de anunciar Jesus, mudando o status quo (a conversão da Lídia, a conversão do carcereiro). Embora deva-se registar que o último milagre de Actos seja do carcereiro. Aqui já se afigura o final de Actos: apesar de muitas prisões e amarras quem com Cristo está é livre.

1ª e 2ª de Pedro

As duas cartas de Pedro, pelo menos atribuídas a ele, apresentam uma relação quer à referência da segunda carta em relação à primeira (2 Pe 3,1) quer a alguns temas o apelo à virtude 1 Pe 4,7s e 2 Pe 1,5s e a exortação à vocação cristã.

Apesar destas míseras referências de minha parte, evidencia-se mais as diferenças que as semelhanças. O registo da primeira de Pedro é mais litúrgico, onde se destacam frequentemente citações do Antigo Testamento; faz menção frequente de Cristo e dos seus sofrimentos para que os sofrimentos dos destinatários da carta – peregrinos, estrangeiros vejam alegria no seu sofrimento como associado Aquele que tudo sofreu por nós. Exorta ao amor fraterno entre os cristãos e apela à exemplaridade na obediência às autoridades, dos escravos aos seus senhores para que nada o possam acusar justamente. E caso sofrerem perseguição sejam considerados dignos da glória de Deus.

A segunda carta de Pedro apresenta-se mais escatológica e preocupada com as falsas doutrinas e os falsos mestres, desvios que se verificavam na comunidade. Faz uma descrição quase exacta das manobras usadas por estes falsos mestres e apela à fidelidade. Apresenta a necessidade de estarmos preparados para que Deus nos “encontre imaculados, irrepreensíveis e em paz”. Curioso salientar a referência a Paulo que também é vítima de deturpação por parte de “ignorantes e pouco firmes”.

Paz a todos vós que estais em Cristo.

A Ele seja dada glória, agora e até ao dia eterno. Ámen.

1Pe 5, 14 - 2Pe 3, 18

Segunda Carta de Pedro

“Mas há uma coisa, caríssimos, que não deveis esquecer: um dia para o Senhor é como mil anos, e mil anos, como um só dia.”

A Segunda Carta de Pedro sublinha a necessidade de esperar pela segunda vinda de Jesus, e é nesta linha que vem esta citação. São por estas advertências da demora da parusia, grandes diferenças linguísticas da 1 Pedro, a dependência da Carta de Judas e as possíveis alusões ao gnosticismo que a Segunda Carta de Pedro é vista como tardia em relação à primeira, e escrita por um autor anónimo, não S. Pedro como a carta pretende mostrar.

Este versículo não só nos faz reflectir sobre a segunda vinda do Senhor, mas também sobre o tempo. É difícil imaginar que para Deus não existe o tempo. 24 horas podem dar para mudar a vida, podem estar cheias de coisas interessantes e significativas, tal como uma vida ou anos inteiros passam num instante. O tempo é ilusório, pode passar com imensa velocidade ou com uma lentidão terrível. Não há maneira, por mais que queiramos, de voltar atrás no tempo.

“Um dia em teus átrios vale por mil” diz o Salmo 84. Assim também o tempo torna-se significativo, produtivo ou até mais lento com Deus. Até pessoas de outras religiões dizem que a oração ou a meditação alarga o tempo... torna-o mais maleável. É por vezes assustador pensar nas possibilidades de ter 24 horas por dias. Se pudéssemos começar de novo, ou não nos preocupar com dinheiro, como é que preenchiamos cada minuto de cada hora? Dizem que se deve viver cada dia como se fosse o último, mas detesto despedidas. Prefiro viver como se fosse o primeirode longas férias, do que estar sempre a pensar que as férias estão a acabar. Acho que a parusia de 2 Pedro é mais um novo começo do que um fim eminente. Já não se trata de viver cada dia como se fosse o último, sem o investimento valer a pena ou com uma despedida eminente, mas sim de começar a viver cada dia com intensidade e significado. Há um espírito de missão na 2 Pedro, uma exortação para estudar a Sagrada Escritura e conhecer Deus mais profundamente. É uma nova folha onde cada dia é uma benção e cada minuto uma oportunidade.

Relação Tg-1Pd-2Pd

Entre os temas comuns a estas três cartas há dois que me saltaram rapidamente à vista: a Provação e a Vinda do Senhor, embora esta última seja tratada com expressões muito diferentes.
Em Tg convida-se à provação e alegria no sofrimento-provação, o que se traduzirá numa obra perfeita, o amor ao outro, em especial aos mais pobres; dado que a Vinda do Senhor está próxima, e que Ele vem como juiz, o autor exorta a não julgar os irmãos (cf. 1,2-4.12; 5,7-11).
Em 1Pd, a expectativa escatológica é também grande, sendo descrita de diversas formas: «a salvação, já prestes para se revelar no último tempo»; «a revelação de Jesus Cristo»; «o dia da visitação»; «está próximo o fim de todas as coisas»; «o julgamento»; «a glória que se há de revelar»; «quando aparecer o Sumo Pastor...». O que não se entende bem é se se trata aqui da expectativa do fim dos tempos propriamente, ou do fim da perseguição, ou do encontro com Cristo depois da morte, e morte provavelmente sangrenta, martirial. De qualquer modo, estando nesta tensão e esperança, o cristão é chamado a ver a sua vida à luz da vida de Cristo, e a considerar os seus sofrimentos como participação e imitação das provações por que Ele passou, alegrando-se nisso. O sofrimento é breve e passageiro, ao passo que a glória esperada é eterna e incomparavelmente superior. Há que viver vigiando e orando no meio desta tribulação, tendo amor para com todos. Portanto, o cristão é chamado também a amar os perseguidores, não se sujeitando contudo ao seu modo de viver pecaminoso - é preferível sofrer e ser atacado por fazer o bem do que por fazer o mal. Tudo isto é possível porque Cristo já o fez por nós, e isso é experimentado na fé e não na visão: sem O ter visto, os cristãos já o amam, porque creram no Querigma, que Cristo entrou na morte e carregou com os pecados do mundo, para que o mesmo pudesse viver para a justiça. Na mesma fé é chamado a viver o cristão, e como se vê, é como em Tiago uma fé que se traduz em obras de amor e não resistência ao mal (cf. 1,3-13; 2,12.18-25; 3,9.14-18; 4,1-4.7-8.12-19; 5,1-4.9-10).
Em 2Pd, já se nota uma impaciência por este «dia do Senhor», este «dia do juízo», por esta «vinda»; já há falsos profetas que pretendem dizer que tudo são fábulas, convidando os cristãos a um viver displicente e mundano. No entanto, o autor refuta tudo isso, exortando os cristãos a viver e a crescer na sua vocação e eleição, porque a espera desse Dia é ocasião para o arrependimento de todos. A provação consiste aqui, pois, em resistir às seduções do mundo e da carne, veiculadas por esses falsos mestres, esperando pacientemente os «novos céus e nova terra, em que habita a justiça»; e também em submeter-se às autoridades, tema que já aflorara em 1Pd. Até ao «dia da eternidade», há que crescer no conhecimento de Jesus Cristo, e isso não é mais que conhecer e seguir a sua vida de sofrimento voluntariamente aceite, que aparecera em 1Pd, e em todas as obras que Ele já realizou, patenteadas em Tg (cf. 2Pd 1,10-11.16; 2,9-10; 3,3-14.18).

SEGUNDA CARTA DE PEDRO

Post 7

Segunda Carta de Pedro


Esta Carta é diferente da Primeira Carta de Pedro. É mais doutrinal. Nesta carta não se percebe a perseguição que viviam os cristãos como na Primeira Carta de Pedro. Esta carta é mais cristológica. Jesus é o modelo a imitar, Ele é objecto de conhecimento:

«Por este motivo é que, da vossa parte, deveis pôr todo o empenho em juntar à vossa fé a virtude; à virtude o conhecimento; ao conhecimento a temperança; à temperança a paciência; à paciência a piedade; à piedade o amor aos irmãos; e ao amor aos irmãos a caridade. Se tiverdes estas virtudes e elas forem crescendo em vós, não ficareis inactivos nem estéreis, relativamente ao conhecimento de Nosso Senhor Jesus Cristo» (1,5-8).

Esta carta em relação à primeira é mais eloquente. É uma carta de despedida «que tenho por meu dever – enquanto estiver nesta tenda – manter-vos alerta com os meus avisos, 14 pois sei que em breve terei de deixá-la, conforme Nosso Senhor Jesus Cristo mo deu a conhecer. 15 E cuidarei de que, mesmo depois da minha partida, possais conservar sempre a lembrança destas coisas» (1,13-15).

É Pedro que nos quer dizer algo importante para que recordemos sempre Jesus. Ele está preocupado, com os falsos mestres; com as heresias; com os que deixam o caminho recto, etc., por isso dirá: «Melhor lhes fora não ter conhecido o caminho da justiça do que, depois de o conhecer, voltar atrás, abandonando a lei santa que lhes foi transmitida» (2, 21).

O seu objectivo é despertar nos cristãos uma correcta maneira de pensar.

Anabela Rodrigues

PRIMEIRA CARTA DE PEDRO

PRIMEIRA CARTA DE PEDRO


A Primeira Carta de Pedro é um dos textos mais importantes do NT para perceber a história do nascimento do Cristianismo. O testemunho que dá das circunstâncias do seu tempo é de extraordinária importância para se conhecer a sociedade do seu tempo.

No começo da Carta, fala-nos dos que «peregrinam na diáspora» (1,1). “Paroikos“(1,1; 1,17; 2,11) define um dos campos semânticos da Primeira Carta de Pedro.

Os “Paroikos” são os estrangeiros, os forasteiros, os que estão fora da sua pátria, não conhecem bem a língua e a cultura do país. Todos sabemos que a migração é um fenómeno dos nossos dias.

Estes “Paroikos” tinham muitas desvantagens no que respeita a direitos em relação aos cidadãos. Havia uma condição de “estranhos”. Creio que este fenómeno ainda acontece nos nossos dias.

Também no AT o “Paroikos”, é estrangeiro. Este substantivo aparece 33 vezes no AT. E o verbo “Paroikeo” aparece 69 vezes no AT.

Fala-se de “Paroikos” a propósito de Abraão: Gn 12,10: "Houve fome naquela terra. Como a miséria era grande, Abrão desceu ao Egipto para aí viver algum tempo".

Também o povo Israelita recorda a sua condição de migrante, errante no Egipto: “Meu pai era um arameu errante: desceu ao Egipto com um pequeno número e ali viveu como estrangeiro, mas depois tornou-se um povo forte e numeroso. Então os egípcios maltrataram-nos, oprimindo-nos e impondo-nos dura escravidão” (Dt 26, 5-6). Eles eram estrangeiros, em terra estranha e sentiam-se privados de direitos.

Por isso, o povo soube acolher no seu seio “Paroikos” e fez leis para defender os estrangeiros: Lv 25,35; Dt 23,8, 21; 24,14).

Ao longo de toda a história de Israel esta categoria de “Paroikos” é fundamental, para perceber a história deste povo e também a dos cristãos.

Paroikos”: aparece-nos 8 vezes no NT.

Jesus faz-se solidário e assume-se como estrangeiro: “Porque tive fome e destes-me de comer, tive sede e destes-me de beber, era peregrino e recolhestes-me, estava nu e destes-me que vestir, adoeci e visitastes-me, estive na prisão e fostes ter comigo” (Mt 25,35).

Sabemos que esta carta vai dirigida para esse “Paroikos” que sofrem por algum motivo “provações”, mas diante desta situação, Pedro encoraja os cristãos:

É por isso que exultais de alegria, se bem que, por algum tempo, tenhais de andar aflitos por diversas provações; deste modo, a qualidade genuína da vossa fé – muito mais preciosa do que o ouro perecível, por certo também provado pelo fogo – será achada digna de louvor, de glória e de honra, na altura da manifestação de Jesus Cristo” (1,6-8).


ANABELA RODRIGUES

II CARTA DE PEDRO

Esta segunda carta de Pedro é como foi a de Paulo a Timóteo, testamento do Príncipe dos apóstolo, pois foi escrita pouco antes do seu martírio, provavelmente desde o cárcere em Roma entre os anos 64 e 67. Os destinatários são todas as comunidades cristãs da Ásia Menor ou seja que seu auditório não é tanto limitado aos judeo-cristãos como o Tiago(1,1). Seja como for, a Carta tem um carácter universal.
O seu objectivo é denunciar graves erros que ameaçavam a fé e os bons costumes, sobretudo a negação da segunda vinda do Senhor.(3,3-4).
Os temas fundamentais desta carta são: a segunda vinda do Senhor(1,16), definida como misericordiosa(3,4.8-10.15), mas que vai trazer uma mudança radical no cosmos; a lembrança da Transfiguração (1,16-19); a inspiração das Escrituras, a importância do conhecimento religioso.
Tudo isto indica que esta Carta é o desenvolvimento da Carta de Tiago.

I CARTA DE PEDRO

Simão Bar Jonas, filho de Jonas que havia de ser Pedro, foi chamado ao apostolado nos primeiros dias da vida pública do Senhor, a quem deu o nome de Cefas ( aramaico Kefa), ou seja "Pedra", em grego Petros, Pedro (Jo1,42) : vemos em Mt16,17-19, como Jesus o distinguiu entre os outros discípulos, fazendo"príncipe dos apóstolos ".(Jo21,15ss).
A sua primeira carta se considera pouco antes de instalar a perseguição de Nero, cerca do ano 63 (cf. IIPe1,1), desde Roma ao que chamam Babilónia por corrupção do seu ambiente pagão. O seu objectivo é consolar principalmente os cristãos dispersos(1,1) que vivendo também no mundo pagão, corriam o risco de perder a fé.
A carta encontra-se dividida em quatro versões:
Saudação inicial e acção de graças:1,1-12;
I. EXORTAÇÃO À SANTIDADE: 1,13-2,10
II.OS CRISTÃOS PERANTE O MUNDO: 2,11-3,12
III.OS CRISTÃOS PERANTE O SOFRIMENTO: 3,13-4,11;
Estamos perante um escrito da segunda geração cristã que pretende animar a fé dos que já tinham desanimado na sua caminhada na Igreja.
IV.ÚLTIMAS EXORTAÇÕES: 4,12-5,14

CARTA DE TIAGO

CARTA DE TIAGO

Nesta carta vemos recolhidas verdades que afectam a todos.

A fé é vista como um dinamismo que produz acções e que só é madura quando se exprime em actos concretos. “Repara que a fé cooperava com as suas obras e que, pelas obras, a sua fé se tornou perfeita” (2,22).

A carta de Tiago procura mostrar também que a verdadeira sabedoria exprime-se pelo comportamento que temos diante das situações: “se algum de vós tem falta de sabedoria, que a peça a Deus, que a todos dá generosamente e sem recriminações, e ser-lhe-á dada” (1,5), “existe alguém entre vós que seja sábio e entendido? Mostre, então, pelo seu bom procedimento, que as suas obras estão repassadas da mansidão própria da sabedoria” (3,13).

Somos pessoas em construção que pouco a pouco vamos crescendo, seguimos o ritmo do crescimento biológico da vida – nascemos, crescemos, morremos – dizemos: é a lei da vida.

Juntamente com o crescimento biológico encontra-se a maduração psicológica, humana e espiritual.

A maturidade humana baseia-se na habilidade para manejar a própria vida e a relação com os outros de uma forma responsável.

Características da maturidade humana:
  • Tolerância das frustrações e da ambiguidade
  • Saber controlar a ansiedade e a insegurança
  • Resistência às hesitações
  • Adaptação a situações novas
  • Capacidade de autocontrole
  • Comportamento elástico
  • Aceitação do passado
  • Capacidade de dar e de receber
  • Aceitação da culpa
  • Capacidade de espera
  • Poder de sublimação
  • Capacidade de enfrentar a dor
  • ...
A vocação cristã, sãmente entendida, colabora, impulsiona e motiva o crescimento humano.

A maturidade é um processo, por isso antes de dizer “este homem é maduro” ou “esta mulher é madura”, teriam que olhar para a sua vida e verificar se sua vida dá resposta aos estímulos à sua volta e se a resposta a esses estímulos é feita em equilíbrio com o seu mundo interior e exterior.

A pessoa madura é a pessoa que sabe encarar o quotidiano, o dia a dia, com recursos humanos suficientes e sabe dar respostas adequadas às situações. Sabe manejar emoções, dados, situações novas e diferentes. Uma pessoa pode ser madura num aspecto e noutro não. De esta forma somos seres em formação e terminamos de crescer.

É o que propõe Tiago quando diz: “Mas peça-a com fé e sem hesitar, porque aquele que hesita assemelha-se às ondas do mar sacudidas e agitadas pelo vento. Não pense, pois, tal homem que receberá qualquer coisa do Senhor, sendo de espírito indeciso e inconstante em tudo” (1,8), ou “pessoa irada não faz o que é justo aos olhos de Deus” (1,20).

A maturidade é a capacidade de saber responder afirmativamente à vida no aqui e agora e baseia-se no amor incondicional. “Feliz o homem que resiste à tentação, porque, depois de ter sido provado, receberá a coroa da vida que o Senhor prometeu aos que o amam” (1,12).

As pessoas maduras adquirem habilidades para serem generosas com os outros e ao mesmo tempo consigo mesmas, porque: “Aquele, porém, que medita com atenção a lei perfeita, a lei da liberdade, e nela persevera - não como quem a ouve e logo se esquece, mas como quem a cumpre - esse encontrará a felicidade ao pô-la em prática” (1,25).

Tiago é bem conhecedor das transformações-distorções que existem em cada um de nós. “Pois, onde há inveja e espírito faccioso também há perturbação e todo o género de obras más. Mas a sabedoria que vem do alto é, em primeiro lugar, pura; depois, é pacífica, indulgente, dócil, cheia de misericórdia e de bons frutos, imparcial, sem hipocrisia; e é com a paz que uma colheita de justiça é semeada pelos obreiros da paz” (3,16-18).

O crescimento espiritual não é um percurso uniforme, a um ritmo constante e perfeito. Mais bem, é feito de contradições, conflitos, lutas internas, tensões, perdidas e ganhos, equilíbrios e desequilíbrios; tudo isto, vai abrindo a um maior horizonte e a uma síntese de vida cada vez maior e mais ricas.


ANABELA RODRIGUES

O conhecimento (gnosis) na 2Pedro

O conhecimento de Deus é um dos grandes temas que a segunda carta de Pedro aborda.
A saudação inicial da carta «Graça e paz vos sejam concedidas em abundância por meio do conhecimento de Deus e de Jesus, Senhor nosso» (1Ped 1, 2) vai nesta perspectiva do conhecimento de Deus e de Jesus Cristo. Assim, a graça e a paz resumem os bens de salvação que são dados aos cristãos.
Ao cristão é-lhe dada a graça, ela é fruto da benovelência de Deus; a paz, por seu lado, é a restauração daquela ordem que o homem perdeu pelo pecado. Agora, esta paz é-nos concedida por Cristo. Assim, estes dons de Deus devem frutificar nos cristãos, isto é, só darão fruto se crescer em nós «por meio do conhecimento de Deus e de Jesus, Senhor nosso.» Tal conhecimento não poderá ser apenas um conhecimento superficial, mas pretende ser um conhecimento que vai muito mais além, através do reconhecimento pela fé, afirmando com o coração e comprometendo pela confissão de que Jesus é o Senhor.
Por isso, toda a vida cristã deve ser um conhecimento de Cristo, mas isto só será possivel se «da vossa parte, deveis pôr todo o empenho em juntar à vossa fé a virtude; à virtude o conhecimento; ao conhecimento a temperança; à temperança a paciência; à paciência a piedade; à piedade o amor aos irmãos; e ao amor aos irmãos a caridade. Se tiverdes estas virtudes e elas forem crescendo em vós, não ficareis inactivos nem estéreis, relativamente ao conhecimento de Nosso Senhor Jesus Cristo.» (1Ped 1, 5-8) Verdadeiramente, o fruto que a vida produz é o do conhecimento de Cristo.

terça-feira

ACTOS E EPÍSTOLAS CATÓLICAS - SABES QUE NOTA ELE TE VAI DAR?

PEÕES EM JOGO- A QUESTÃO PEDAGÓGICA


O último cenário do filme “Peões em jogo” é o de dois universitários de Ciências Políticas, alunos de Stephen Malley (interpretado por Robert Redford), a dialogarem sobre a entrevista de um deles com o referido professor. Sendo este estudante muito absentista e desinteressado, o colega pergunta-lhe se o professor Malley o vai chumbar, pois é sobre as notas que ele lhe diz terem falado. Pensativamente, responde-lhe que não. “Sabes que nota ele te vai dar?” – é a pergunta final. O silêncio do estudante com grande potencial, apesar da sua desmotivação, marca o fim do filme, que segue três fios narrativos entrelaçados: imprensa, política e educação.

Há dois antigos alunos de Malley que, nas montanhas do Afeganistão, em pleno cenário de guerra, lutam pela sobrevivência. Outrora alunos brilhantes, na América, estão, posteriormente, empenhados como indivíduos nas suas causas pessoais e nas do seu país. De algum modo, por terem sido alunos de Malley que, pedagogicamente, os impede de virarem as costas à realidade. Antes agir, mesmo falhando, do que nada fazer.

O estudante pensativo e silencioso do fim do filme tem de resistir a uma vida acomodada e aburguesada, segundo a pedagógica confrontação com o professor Malley. Não é tanto acerca de notas que eles, na entrevista, falaram (isso é o que menos importa!), mas sobre a vida real, que tem as necessárias implicações do intervir ou participar.

Se “a participação a[c]tiva sistemática [na Faculdade de Teologia] custa[-nos] esforço e um esforço que nem todos os professores e os estudantes têm coragem de assumir” (1), mais ainda sermos participantes na sociedade e na Igreja.

Há uma grande revolução numa educação verdadeiramente humanista, centrada na pessoa. (2) A pessoa de todo o estudante há-de responsabilizar-se pela sua própria aprendizagem e pela sua vida, o que muda tudo. O argumento de Mattthew Carnahan "Lions for lambs" ("Peões em jogo") é, em termos pedagógicos, revolucionário. Muda tudo.

Dizer que a teologia é uma actividade intelectual é dizer pouco. A teologia é nascitura da fé. E a fé está no âmago da pessoa do estudante de teologia, para quem é imprescindível o confronto com os melhores professores, que são os homens e as mulheres do confronto com o real, por outras palavras, os pedagogos de agora (e para sempre).

(1) ALSZEGHY-FLICK, Como se faz teologia, Paulinas, São Paulo, 1979, 219.
(2) Cf ROGERS-ROSENBERG, A pessoa como centro, E.P.U.,São Paulo, 1977, 141.

HELENA FRANCO
2007-12-19

SEGUNDA CARTA DE PEDRO - PSICANÁLISE E TEOLOGIA


CONCEITO DE PESSOA – II

“Nascer é ambas as coisas um começo e um fim: o clímax de tudo o que aconteceu desde o momento da fertilização através de nove meses de crescimento no útero.” (1) No útero são principalmente os sentimentos belos, bons, agradáveis, que nos permitem estar vivos. Mas, nascer é transitar da agradável vida intra-uterina para a menos agradável vida extra-uterina. São os sentimentos desconfortáveis, inadaptados, portadores de sofrimento, que nos dão a possibilidade de aprofundar a nossa existência e de nos abrir ao que nela há de mais decisivo. Nascer é o desconforto de uma separação. Nascer é o sofrimento primevo do paroikos (palavra grega usada na Primeira Carta de Pedro).

A transição do oikos uterino para fora é uma dor apaziguada pelo contacto morno com o corpo da mãe. Ora, o aleitamento alimenta física e emocionalmente. “ A mãe suficientemente boa alimenta a o[m]nipotência do lactente e até certo ponto vê sentido nisso. E o faz repetidamente. Um self verdadeiro [ou por outras palavras: sujeito] começa a ter vida, através da força dada ao fraco ego [eu individual] do lactente pela complementação pela mãe das expressões da o[m]nipotência do lactente.” (2)

Deus tem rosto materno. Maternalmente, Deus dá leite espiritual. O Deus de Jesus Cristo é o da verdade cristã, a qual é apresentada na Segunda Carta de Pedro.

Escrita contra os falsos doutores e contra a gnose, a Segunda Carta de Pedro tem como eixo a verdade, em termos teológicos, e a verdade do self, em termos da psicanálise. De facto, a oposição aos falsos doutores e à gnose constitui, segundo a nossa leitura psicanalítica, uma oposição ao falso self.

Mas dentro de nós mesmos ambos existem falso e verdadeiro self, pois assumimos continuamente a tarefa de unir contrários, elegendo a verdade.

A verdade é do inconsciente e é de Deus, ou seja, é daquele que está mergulhado nas águas profundas do eu. Aceder ao inconsciente é conhecer. E é de conhecimento que a Segunda Carta a Pedro fala (2 Pe 1,3-21), terminando deste modo: “antes, crescei na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. A ele seja a glória, tanto agora como no dia eterno.” (2 Pe 3,18).

Em termos psicanalíticos, pessoa é, ao mesmo tempo, inconsciente e consciente. (3) Ora, o potencial inato e congénito da pessoa manifesta-se, na sua vida, sem que todas as possibilidades pessoais se realizem. A essa manifestação chama-se, na análise junguiana, individuação.

“A individuação é mais busca que alvo, mais dire[c]ção a seguir do que local de descanso da caminhada.” (4) Tornar-se cristão é uma caminhada no sentido de se individualizar, sendo capaz de testemunho e de martírio. Tornar-se cristão é relacionar-se não tanto com os enquadramentos históricos mas com a matriz trans-histórica do Cristianismo.

No século II, na Carta a Diogneto escreveu-se que os cristãos são a alma do mundo, “sal da terra”. Ser cristão é um ser pessoa de outro tipo. Do tipo de percorrer caminhos de individuação cristã e de se deixar alcançar pela verdade de Deus-mãe, que complementa a verdade do self / sujeito.
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(1) PAPALIA-OLDS, Human Development, McGRAW-HILL,INC,1995, p 81.
(2) WINNICOTT, D. W., O ambiente e os processos de maturação, Artes Médicas, Porto Alegre, 1982, p 133.
(3) Há autores que consideram o aparelho psíquico subdividido em: subconsciente, inconsciente e consciente.
(4) HALL, J. A., A experiência junguiana – análise e individuação, Cultrix, São Paulo, p 62.
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HELENA FRANCO
2007-12-19

A Liberdade (1 Pe 2,11-25, e em particular o v. 16)

Os versículos do capítulo 2,11-25 pretende afirmar o sentido do agir, fundado que está no apelo de Cristo [2,21 Ora, foi para isto que fostes chamados; visto que Cristo também padeceu por vós, deixando-vos o exemplo, para que sigais os seus passos.], o justo sofredor que, em fazendo o bem – isto é a vontade de Deus [2,15 Pois é esta a vontade de Deus: que, praticando o bem, façais emudecer a ignorância dos insensatos.] – suportou toda a nossa fraqueza [cf. 2,24s.]. Deste modo, o cristão, forasteiro no mundo [cf. 2,11], há-de suportar os insultos que tal estranheza benfazeja lhe alcança [cf. 2,12], calando a maldade com a bondade (desconcertantemente submissa) [cf. 2,15.18.20b]. Com efeito, a condição estrangeirada resulta dessa insólita liberdade que, ao invés de arredar da sociedade (como se fora apátrida), convoca para uma presença amável [2,16-17. Actuai como homens livres, não como aqueles que fazem da liberdade um pretexto para a maldade, mas como servos de Deus Respeitai a todos, amai os irmãos, temei a Deus, honrai o rei.], eventualmente capaz de comover os demais para que louvem, também eles, a Deus [cf. 2,12 Tende entre os gentios um comportamento exemplar, de modo que, ao acusarem-vos de malfeitores, vendo as vossas boas obras, acabem por dar glória a Deus no dia da sua visita.]. A liberdade dá-se precisamente nesse dinamismo vocacional paradoxal, por que o cristão (como Cristo) é elevado enquanto se reclina, submisso, sob o peso dos outros [cf. 2,21.24]. Deste modo, ser homem livre é ser como Cristo [cf. 2,21 Ora, foi para isto que fostes chamados; visto que Cristo também padeceu por vós, deixando-vos o exemplo, para que sigais os seus passos.]: tal é a liberdade cristã. Também aparece este aspecto no segundo Pedro capítulo 2, 19 Prometem-lhes a liberdade, quando eles próprios é escravos da corrupção, pois é-se escravo daquele por quem nos deixamos vencer.

The Final judgment in St. James (Tiago)

A Carta de Tiago dá uma grande importância ao anúncio do Juízo final, tal como todos os escritos da pregação apostólica. Em comparação com a 1ª Carta de Pedro, o termo surge mais vezes: 11 ocorrências. Dela, destaco os seguintes elementos:1. A Carta de Tiago apresenta o Dia do Julgamento como uma realidade iminente: “Olhai que o Juiz já está à porta” (Tg 5,9) e apela à conversão.2. De forma mais evidente do que a 1ª Carta de Pedro, refere que o critério que será usado no Dia do Juízo final é o da Lei da liberdade para os que receberam o Evangelho (Tg 2,12). Os critérios perversos com que os homens julgam são, assim, denunciados (Tg 2,4).3. Também a exemplo da 1ª de Pedro afirma claramente que cada um será julgado conforme a medida que tiver aplicado aos outros (Tg 2,13).4. Na Carta de Tiago afirma-se vivamente a superioridade do Julgamento divino: há um só legislador e juiz, aquele que pode salvar e condenar. Por isso pergunta o autor: Quem és tu, para julgar o teu próximo (Tg 4,12)?5. Em Tg 3,1 fala-se de um Julgamento mais severo para os cristãos. A perfeição é exigida e, no contexto em que está inserida esta afirmação, ela é alcançada pelo domínio da língua.Após esta breve e concisa análise à Carta de Tiago a partir do termo Julgar/Julgamento penso ser evidentes as semelhanças com a 1ª Carta de Pedro. Aliás, como foi referido no início, é um tema comum a todos os escritos da pregação apostólica. A título de conclusão, considero também que o termo e tema do Juízo Final é uma das características mais preponderantes e constituintes da identidade das comunidades cristãs nascentes. Colocado no horizonte de cada cristão, ele torna-se como que o momento decisivo da vida humana: ser salvo ou ser condenado. E esse julgamento tem já lugar na vida terrena, mas a sua consumação é revestida de um carácter escatológico, vivamente presente na 1ª Carta de Pedro e na Carta de Tiago.

PRIMEIRA CARTA DE PEDRO - PSICOLOGIA E TEOLOGIA

CONCEITO DE PESSOA - I

A génese da pessoa é, no nosso entendimento, o aparecimento da primeira estrutura de células por volta das 8 semanas da gravidez, quando o embrião passa ser feto, estando completamente no estágio fetal, o estágio final da gestação, pelas 12 semanas. “Ainda no interior do útero, cada um de nós é único.” (1) E é esta singularidade que nos faz pessoas.

Oikos, a casa é precedida pelo útero materno. Ambos determinam o que a pessoa é. Ambos dão identidade à pessoa. Se o estudo da Primeira Carta de Pedro de John H. Elliot, Un hogar para los que non tienen patria nem hogar, nos detém, neste post, sobre o conceito de oikos (casa) associado ao de pessoa, deter-nos-á, no próximo post, sobre o conceito de paroikos (fora-de-casa) associado a esse mesmo conceito. Começamos, no entanto, a desbravar um cam
inho de reflexão teológica desta Carta, com base na psicologia do desenvolvimento e na psicologia rogeriana em diálogo com a teologia de Paul Tillich.

Que é, nesta Carta, ser pessoa? Há, em nosso entender, um nexo entre Paulo e Pedro. Ambos fundam uma nova política das coisas, ao fundarem o sujeito.

A pessoa é uma construção do Cristianismo. O Cristianismo é, na Primeira Carta de Pedro, anunciado como uma oikos pneumatikos (casa espiritual) [1 Pe 2,5]. E os cristãos são oikou tou Theou (casa de Deus) [1 Pe 4,17].

Ser pessoa é estar no tempo e no espaço, na biografia e na história, desde a vida intra-uterina até ao trânsito para a vida extra-uterina (como veremos no próximo post), sem ser o oposto da sua natureza essencial. Ser pessoa é ser um indivíduo realmente vivo, ou por outras palavras, ser “pedra que vive” (1 Pe 2,5) da natureza da “principal pedra, angular” (1 Pe 2,7), isto é, da natureza de Cristo.

Nas Cartas de Paulo e na Primeira Carta de Pedro, ser pessoa corresponde à mesma função de identificação em que o Cristianismo é uma identidade dada pela pessoa de Cristo.

A especificidade cristã é ser uma alternativa aos laços sociais caducos. Trata-se, então, de se tornar social, no sentido em que o teólogo Paul Tillich afirma, no decorrer de um diálogo com o psicólogo Carl Rogers (2):

“Tornar-se social tem a ver com o amor, no sentido da palavra grega agape, que é uma palavra particular no Novo Testamento, que significa aquele amor que é descrito por Paulo em 1 Cor 13, e que aceita o outro como pessoa e então tenta reunificar o homem, ultrapassando a separação existencial, que existe entre o homem e o homem.”

Neste sentido, tornar-se social é tornar-se cristão. E tornar-se cristão é tornar-se mais e mais humano.


(1) PAPALIA- OLDS, Human Development, McGRAW-HILL,INC, 1995, p 73.
(2) O diálogo entre Paul Tillich e Carl Rogers ocorreu a 7 de Março de 1965 no estúdio da rádio/televisão de San Diego Styate Collegw in Califórnia. Foi a última aparição pública de Tillich. (Carl Rogers: Dialogues, Edited by Howard Kirkchenbaum and Valene Land Henderson, Houshton Miflin Company, Boston, 1989)



HELENA FRANCO
2007-12-18

Proposta de uma Teologia da fé

A Segunda Carta de Pedro foi escrita tentando proteger a comunidade de um grupo de falsos mestres que pervertiam a verdade da fé chegando mesmo a “negar o Senhor”, e traíam-na com os seus comportamentos hedonistas e imorais, constituindo-se assim um desvio ao caminho recto. Ao que tudo indica eram um grupo gnostizante, para o qual a fé não implicava comportamentos com ela coincidentes. Em reacção a este entendimento da fé (que era vista como gnosis), o autor esboça uma interessante teologia da fé, tomando-a não como uma realidade isolada mas como complexo de várias atitudes interiores:

Por este motivo é que, da vossa parte, deveis pôr todo o empenho em juntar à vossa fé a virtude; à virtude o conhecimento; ao conhecimento a temperança; à temperança a paciência; à paciência a piedade; à piedade o amor aos irmãos; e ao amor aos irmãos a caridade.

2 Pe 1,5-7


Fé (é já a virtude; não o objecto desta) – virtude (como “energia moral”) – conhecimento (não é apenas especulativo) – temperança (domínio de si) – paciência (provavelmente, refere-se à espera da segunda vinda) – piedade (capacidade de permanecer dentro da ordem estabelecida por Deus, ou seja, contra as heresias e actos imorais) – amor aos irmãos (amor referido à comunidade eclesial) – caridade (parecido com o anterior, mas com um sentido universal)*

Esta lista de virtudes não é original no corpus do Novo Testamento, ocorrendo noutros livros com outras “virtudes” e com outra forma:

Por seu lado, é este o fruto do Espírito: amor, alegria, paz, paciência, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, auto-domínio. Contra tais coisas não há lei.

Gálatas 5,22-23

pela pureza e pela ciência,pela magnanimidade e pela bondade, pelo Espírito Santoe pelo amor sem fingimento, pela palavra da verdadee pelo poder de Deus, pelas armas ofensivase defensivas da justiça

2 Cor 6,6-7

Mas tu, ó homem de Deus, foge dessas coisas. Procura antes a justiça, a piedade, a fé, o amor, a perseverança, a mansidão.

1 Tim 6,11

'Conheço as tuas obras, a tua caridade, a tua fé, a tua dedicação, a tua constância e as tuas últimas obras, mais numerosas que ao princípio.

Ap 2,19

Contudo, tem traços distintivos: ao contrário delas, que são simples enumerações, exprime uma dinâmica de inter-relação entre as várias virtudes, não as sectoriza, pois incluem-se mutuamente e uma leva a outra, como se constituíssem uma cadeia e como se propusesse um percurso. Cada elemento está incompleto sem os outro e por isso conduz para ele. Deste modo, a fé é um todo, é uma rede constituída por várias facções, é um puzzle. É como um diamante com as suas várias faces; olhando para uma delas veremos o diamante todo. É como uma árvore que só é árvore na medida em que é composta destes ramos e na medida em que dá frutos - “a gnosis é um momento do processo da fé que leva ao amor, mas (…) há que chegar aos frutos”**. Se quiséssemos condensar, diríamos que, em suma, fé é conhecimento, virtude e amor. Ela é este todo unitário, uma realidade tripla, uma atitude total. Esta carta alarga a fé à dimensão racional (conhecimento), comportamental, prática e relacional (virtude e amor), e desta forma responsabiliza-a. Com ela se percebe que não se pode ser um grande crente se não se for um grande homem, nem um homem de fé se não se for um homem de acção. Faz da fé projecto de se ser humano, homem completo, contestando aqueles que a entendem como cúmplice de um hipotecar da razão, do coração, da consciência e da acção.

___________

* Cf. FRANCO, Ricardo – Cartas de San Pedro (traducción y comentário). In In LEAL (dir.) – A Sagrada Escritura: texto e comentário. III. BAC : Madrid, 1967. p. 318-319.
** ALEGRE, Xavier, TUÑI, Josep-Oriol – Escritos joánicos y cartas católicas. Estella – Editorial Verbo Divino, 1998. p. 366.

Uma visão panorâmica da Segunda Epístola de Pedro

II Pedro terá provavelmente sido escrita, por volta dos anos 65 a 67, uns três anos depois da primeira carta. A epístola teria sido redigida pouco antes da morte do apóstolo que, conforme a tradição cristã, teria sido crucificado de cabeça para baixo, durante as perseguições empreendidas pelo imperador Nero. Assim, o local mais provável onde a epístola teria sido escrita é a cidade de Roma.
Os prováveis destinatários da carta seriam a Igreja como um todo, gentios e judeus cristãos espalhados pela Ásia Menor, que seriam as mesmas comunidades da primeira epístola, onde se proliferava o gnosticismo.
O propósito da obra é advertir os cristãos contra os ensinamentos dos falsos mestres, exortando-os a continuar crescendo na fé e no conhecimento de
Cristo.
Sabendo que seria morto pela sua fé, Pedro diz que buscaria meios para que as suas mensagens pudessem continuar a ser propagadas após o seu martírio (2Pe 1, 12-15).
Dividida em três capítulos, a epístola aborda brevemente a certeza sobre o retorno de Jesus Cristo, fazendo uma interessante comparação com o
dilúvio na época de Noé (2Pe 2, 5) onde aparece apenas como um castigo, porém na 1Pe 3, 20-21 surge também como figura do baptismo.
Ao final, Pedro recomenda que o cristão deve esperar o retorno de Jesus, viver com rectidão, estudar as Escrituras e buscar o seu crescimento, fazendo uma menção às epístolas de
Paulo, as quais já estariam sendo deturpadas desde aquela época (2Pe 3, 15-16).
Devido às diferenças no estilo textual em relação à primeira epístola, a autoria de II Pedro muitas vezes chegou a ser colocada em dúvida nos primeiros séculos da Igreja, conforme defendia o historiador
Eusébio de Cesareia, já que não fora citada antes de Orígenes no começo do século III.

Cornélio, uma ajuda preciosa!

Act 10, 24: «Chegou a Cesareia, um dia depois. Cornélio estava à espera deles com os seus parentes e amigos mais íntimos, que havia reunido».
Segundo Act 10,1, Cornélio era centurião da corte chamada «italiana», como já pude descrever num post anterior. Vejamos agora de que modo o personagem Cornélio nos pode iluminar a compreensão de Actos.
Analisando o lugar teológico dos capítulos 10-11 de Act vemos que representa o ponto de viragem para a legitimação da Igreja pagã-cristã. Se em Act 9 se narra a conversão de Paulo, aqui aparece a conversão de Pedro: na visão de Act 10, 9-16, precedida pela visão de Cornélio (Act 10, 1-8), Pedro é chamado a acreditar no inacreditável, a saber, que a mesma experiência do Pentecostes no Cenáculo (Act 2, 1-13), e portanto em ambiente judaico, dá-se também em casa de pagãos (Act 10, 44-48). Pedro é chamado a fazer uma leitura da realidade: «Ora, apenas começara eu a falar, caiu o Espírito Santo sobre eles, assim como nós no princípio. Lembrei-me então desta palavra do Senhor: ‘João, na verdade, baptizou com água, mas vós sereis baptizados com o Espírito Santo’. Portanto, se Deus lhes concedeu o mesmo dom que a nós, que cremos no Senhor Jesus Cristo, quem seria eu para poder impedir a Deus de agir?» (Act 11, 15-17). Desta forma, poderia avançar com uma conclusão: se em Act 10,44 se afirma que «o Espírito Santo caiu sobre todos os que ouviam a Palavra», onde por «todos» se entendem exactamente os que estavam em casa de Cornélio, então a conversão dos familiares e amigos de Cornélio passa pela sua própria conversão pessoal. Isto que dizer que, sendo ele o Paterfamilias, a sua adesão ao cristianismo implica a dos seus familiares, sobre os quais também caiu o Espírito.

Pedro como testemunho de fé

Existe uma relação entre a 1º de Pedro e a 2ª. na 2ª de Pedro os destinatários são como que não referidos de forma clara, mas que são cristãos. Logo no começo do 1º v. o autor apresenta como "simão Pedro, servo e apostolo de Jesus Cristo". Mais tarde Pedro menciona que presenciou o episódio da transfiguração, ele aparece como um testemnho de fé.
A 2ª de Pedro começa com uma saudação, e esta saudação ja se encontra na 1ª carta. Em termos de divisão temos o apeloa perseverança na fé; no segundo bloco a ideia fundamnetal tem a ver com os falsos profetas, e que é preciso uma fé profunda para não se cair numa profecia falsa. A última ideia desta carta é a dimensão escatológica, isto é a vinda do Senhor. A 2ª carta de pedro apela a uma fé que se inscreve na pessoa de Jesus. Jewus é digno de fé por aquilo que é, não importa o sofrimento. É verdade que nesse período afirmar -se como cristão não é fácil, tem um preço caro. É dentro deste quadro de perseguição da Igreja e dos seus que se deve entender a 2ª de Pedro. Pedro é alguém que também faz a experiencia do difícil, ele vê o que se passa e não quer ficar de braços cruzados.

1 Carta de Pedro

“Confiai-lhe todas as vossas preocupações, porque Ele tem cuidado de vós.” – 1 Pe 5,7

A Primeira Carta de Pedro tem duas correntes teológicas muito fortes de sofrimento e de identidade cristã. Será que podem estar intimamente ligadas? Diz-se que são nos tempos de dificuldade que se vê o verdadeiro carácter da pessoa... de certo modo poderia-se dizer “diz-me como sofres/enfrentas dificuldades e eu dir-te-ei quem tu és”?

Os cristão têm um instrumento único quanto ao sofrimento, que é esta ideia de 1 Pe 5,7. Esta frase fez-me lembrar duma canção do Alan Jackson (não é original dele) que se chama “What A Friend We Have In Jesus”. Traduzida, a primeira parte é mais ou menos assim:

Que amigo temos em Jesus,
Todos os nossos pecados e dor carregar!
Que privilégio poder levar
Tudo para Deus na oração!
Ai que paz de que por vezes abdicamos,
Ai que dor desnecessária carregamos,
E só porque não levamos,
Tudo a Deus na oração.


Confiar tudo a Deus na oração é recentrar na verdade da identidade cristã: somos filhos de Deus, Pai que tem todos os nossos cabelos contados, e Jesus Cristo sofreu e morreu por nós. Não estamos sozinhos nem temos que morrer com os nossos pecados, pois Cristo já venceu o sofrimento e a morte. Os cristãos não devem ter um “ateismo funcional” (= crença que nada acontece se não o fizermos acontecer): “Embora a nossa linguagem cristã fala muito bem sobre Deus, o nosso modo de funcionar supõe que Deus está morto ou em coma” (do livro The Ragamuffin Gospel). São nos tempos de sofrimento que uma pessoa é despojada e forçada a reafirmar esta confiança em Deus, o que a distingue verdadeiramente como cristã.

Segunda Epístola de Pedro

A segunda epístola do apóstolo Pedro seria escrita, provavelmente, alguns anos depois da primeira. O seu propósito não é tanto exortativo mas de advertência e esclarecimento, animando aos cristãos a continuar crescendo na fé e no conhecimento de Cristo. A primeira foi destinada para animar e fortalecer sob as perseguições e provações; a segunda, porém, tinha por objectivo preveni-los contra os falsos mestres e suas doutrinas corrompidas; nem uma só vez são mencionados os sofrimentos do Senhor. A primeira, foi escrita para consolar; a segunda, para advertir. Na primeira, há muito sobre o sofrimento; na segunda, temos muito sobre o erro. Outra diferença a realçar é o léxico: nada têm a ver uma com a outra; exemplo disto são os dois termos diferentes para referir-se à segunda vinda do Messias: na primeira o termo é apocalipse, na segunda parusia. Parusia vem do grego e significa: “uma nova vinda ou visita”. No mundo helenista usava-se para narrar a visita de um rei ou de uma rainha a uma cidade. No Novo testamento essa palavra adquire o seu significado mais típico: o segundo advento do Messias revestido de poder e majestade, para fundar Seu Reino Glorioso Universal.
As primeiras comunidades cristãs pensavam que a parusia ia acontecer de forma inminente, foi assim que interpretaram as palavras de Jesus: “Em verdade vos digo: Não passará esta geração antes que tudo isto aconteça” (Mt 24,34; Mc 13,30). Em Tessalônica muitos deixaram até de trabalhar. O próprio São Paulo, no começo, achou que estaria vivo por ocasião da vinda do Senhor ( cf.1Ts 4,15.17).
Na segunda de Pedro encontramos um esclarecimento interessante. A primeira comunidade não distinguiu bem entre proximidade teológica e proximidade cronológica, e durante algum tempo, pensou que fosse iminente esta última, por isso não entendiam o atrasso. O apóstolo dá-nos uma explicação desta demora (cf 2Pe 3, 9-13): O suposto retasso é devido apenas à paciencia misericordiosa de Deus que quer dar a todos o tempo necessário para converter-se. A sua vinda é certa mas o momento é velado para não nos confiarmos e permanecer vigilantes.

segunda-feira

Estêvão para gregos e troianos

Na economia narrativa de Lucas no livro dos Actos dos Apóstolos, Estêvão aparece aquando de sucessivas contendas entre a comunidade dos judeus e o novo grupo dos je ne sais quoi. Lucas apresenta os judeus de pedigree fartos destes judeus de segunda. Como que em provocação, Estêvão, um híbrido, judeu-helenista, aparece no auge da saturação. O autor, não só faz questão de colocar um semi-grego a “fazer prodígios” entre o povo como o coloca a ensinar a história da salvação aos mestres de Israel. A sua morte, já esperada depois de tamanha hybris, simboliza o início de uma outra saturação, de uma desistência dos puro-sangue por parte destes insubordinados, e uma incursão no mundo dos esquecidos. Com o placet de Saulo na lapidação do diácono protomártir procura-se outra integração e outra tentativa de recuperar destinatários. Paulo acabaria por personificar o paradoxo do judeu ferrenho convertido e enviado aos paroikós, aos de fora de casa. Lucas revela a sua singularidade de narrador integrador ao saber dominar o papagaio não deixando escapar nenhum fio.

Sofrimento / Alegria; Saudade / Esperança


Esta é a imagem do rosto do Cristo crucificado que se encontra da capela do castelo onde são Francisco Xavier viveu a sua infância e adolescência. Acho o pormenor de estar a sorrir – um pormenor que não é pormenor, de um refinado interesse e beleza. Esse sorriso do crucificado vai ao encontro da forma como a Primeira Carta de Pedro interpreta a cruz e Jesus, o sofrimento e o sofredor. Este sorriso diz que ao seu sofrimento absoluto, Cristo responde com uma alegria quase absurda, ainda mais impensável que o seu próprio sofrimento. O sorriso deste crucificado é inútil, e por isso especialmente belo - não o salva da morte nem do escândalo. E é este sorriso a utopia de Pedro; ele propõe a extravagância de se dar em troca da dor que se recebe uma alegria irrazoável, e, paralelamente, de se dar em troca do mal o bem, em troca da rejeição o amor. Deste modo, a fé torna-se um saber sofrer. A cruz ensina que a mortificação e a vivificação são dois aspectos duma mesma transformação. Que o sofrimento tem várias funções, e só na sua compreensão compreenderemos o seu importante papel. O sofrimento é revelador do sujeito na parte de si mesmo que não muda a sua identidade com o estatuto social.* É uma educação para vivermos em função do juízo de Deus e não do juízo dos homens. E por isso, a rir na cara da dor.

Que sofrimento é este? E, esclarecido este aspecto, que alegria é essa?
O Roberto, num dos seus posts, afirmou:
“(…) a tensão que todo o estrangeirado conhece, que é a de ser um deslocado desperto para aquele outro local que a saudade invade.”
Cito esta frase pois julgo ter a chave para se entender a essência deste sofrimento partilhado pelos destinatários da carta (a título de proposta de interpretação): a saudade. Em primeiro lugar, a saudade e o sofrimento destes cristãos assemelham-se por serem um misto de tristeza e de alegria, por derivarem do amor e por ele ser experimentado numa distância. A problemática do sofrimento dos cristãos é idêntica à da saudade: eu amo mas não tenho; há uma posse e proximidade espiritual mas não física e factual. Segundo Leonardo Coimbra, “a saudade é a lembrança da pátria com o desejo do regresso”¨**; era isto que os cristãos sentiam: saudade da sua pátria essencial e o desejo de nela viverem. Em segundo lugar, ambas são intermédios, existindo em função do encontro que se constituirá como regresso e alegria.

Aponto três dimensões desta saudade/sofrimento: saudade espacial, saudade temporal e saudade ontológica. Espacial atendendo ao início da carta: são cristãos forasteiros, “fora-de-casa”; temporal atendendo aos traços escatológicos da carta – o sofrimento gera saudade e esta gera a esperança do tempo que virá, o tempo final da alegria; e a ontológica: o desejo de ser o que é (cristão) e de não poder ser… a saudade de si próprio, tem se saudade da sua identidade descriminada e perseguida. Como definiu Leonardo Coimbra (mais uma vez), saudade é um “excesso de presença”, da presença de Cristo, no caso da carta. Excesso que tiveram de conter solitariamente. Por isso Pedro aponta alternativas: responder com alegria louca ao sofrimento louco, com bem ao mal e com esperança à saudade.

* cf. CALLOUD, Jean; GENUYT, François – La premiére epître de Pierre : analyse semiotique. Paris : Cerf, 1982. p. 173 – 205.
** COIMBRA, Leonardo – Sobre a Saudade. In “A Águia”. III série, n.ºs 11-12, 923.

A graça e o conhecimento de Cristo estejam sempre convosco!

A segunda carta de Pedro, movida em torno do eixo da verdade, fala contra os falsos doutores que apelam a uma liberdade escravizante e refuta a negação dos acontecimentos escatológicos por parte deles; para isso primeiramente exorta os cristãos a manterem-se firmes na doutrina transmitida (1, 3-21) e depois contradiz as ideias falsas (2, 1-3.18-21). Pedro, quer seja o autor da carta ou uma pseudonímia, adverte, como verdadeiro pastor, contra a falsa gnose sedutora, apelando os cristãos a rejeitá-la, pois no dia em que menos se esperar, o Senhor virá. E se ainda não o fez foi em prol da nossa salvação, manifesta na sua paciência, pois quer que todos se convertam.
A saudação final condensa como que em resumo todo o essencial da carta, “Vós, caríssimos, dado que sabeis isto de antemão, estai alerta para que não venhais a descair da vossa firmeza, arrastados pelo erro desses malvados. Crescei, antes, na graça e no conhecimento do Nosso Senhor e Salvador, Jesus Cristo. A Ele seja dada glória, agora e até ao dia eterno. Ámen” (3, 17-18)

1Pedro e 2Pedro: Diferança ou continuida?

As duas Cartas (1P e 2P) são dirigidas aos crentes (judeus) dispersos na Ásia Menor, e que o apostólo evoca no priemeiro versículo; a segunda Epístola fala em si mesma, é uma segunda carta dirigida às mesmas pessoas (cristãos judeus dispersons na Ásia Menor) [2P 3,1], de tal modo que uma e outra foram dirigidas aos judeus da Ásia que tinham a mesma fé que o Apóstolo [(2P 1:1].
As duas cartas têm um objectivo comum: o comportamento exemplar dos crentes e o governo divino.
A primeira carta fonda-se sobre a doutrina ao apelo celeste. Ela apresenta os cristãos como pelegrinos e estrangeiros neste mundo (2:11). O comportamento que convém a tais pessoas é mais desenvolvida que a doutrina. O Senhor Jesus, que foi pelegrino e estrangeiro neste mundo, é apresentado como modelo (2:21).
As duas Cartas falam do justo governo de Deus desde o inicio até o consumo de todas as coisas (2P 3:12), afirmam também que haverá novos ceús e uma nova terra onde habiterá a justiça (2P 3:13). A primeira carta fala do governo de Deus para os cristãos; a segunda, do governo em relação ao julgamento dos maus. No entento, apresentando o apelo celeste, o apóstolo apresenta também a salvação, a libertação da alam, em contraste com as libertações temporais dos judeus.
o meio pelo qual Deus realisa o seu designo de graça, é a santificação pelo Espírito Santo.
Pedro deseja aos santos "a graça e a paz (1:3). Assim, o sofrimento é a esperança e a herança do cristão. É uma esperança fora deste mundo (1:4) e não a herança de canã. A misericórdia de Deus tinha regerado os judeus, uma esperança viva, pela resurreição de Jesus dentra os mortos.
Ps: vou continuar a reflexão de 1P e 2P mais tarde...
Max ATANGA

Carta de Tiago

“Não tendes, porque não pedis. Pedis e não recebeis, porque pedis mal, para satisfazer os vossos prazeres.” Tg 4, 2-3

Na minha primeira leitura da Carta de Tiago este versículo foi um que sublinhei. Achei esta carta carregada com versículos muito significativos e com dicas muito em conformidade com experiências que vivo mesmo hoje. Talvez seja pelo próprio estilo da carta, com sete andamentes que culminam com uma máxima.

Achei este versículo muito directo. Fez-me lembrar do conceito do livro/DVD O Segredo que agora está muito em voga. A filosofia deste livro é que se pedirmos algo com confiança, isto nos será dado. O problema é quando pedimos inconscientemente coisas negativas, como por exemplo estar sempre a queixar-te de que estás cansada só te fará mais cansado ainda. Este versículo diz-me muito, especialmente nesta época do Natal. Outros lugares na Biblia também ressoam esta mensagem de que “tudo quanto pedirdes com fé, na oração, haveis de recebê-lo” (Mt 21,22). Pedir até é a parte fácil, mas acho que até o seguidor mais fiel de O Segredo não pode ter confiança absoluta que tudo o que pedir ao universo lhe será dado, isto porque Deus é maior do que nós. Ninguém pede cancro ou a morte dum filho, mesmo a pessoa mais negativa do mundo, e acho que qualquer cristão já pediu a Deus uma boa nota ou que algo lhe corra bem. Já pedi muitas coisas a Deus que não se realizaram, tal como filhos pedem coisas aos pais que nem sempre é para o melhor deles.

Este Natal reparei que os meus desejos modificaram-se um pouco. Espero estar a melhorar nesta arte de pedir bem. Gostava de seguir à letra a citação anónima que diz, “Não rezes para ter uma vida fácil, mas para ser uma pessoa forte.” Pedir bem deve ser o verdadeiro espírito natalício: amor, família (e cães) e aquele sentimento da alegria e anticipação de dar uma oferta que sabes que a pessoa vai adorar.

Onde está o óleo?

Jesus percorria as aldeias vizinhas a ensinar. Chamou os Doze, começou a enviá-los dois a dois e deu-lhes poder sobre os espíritos malignos. Eles partiram e pregavam o arrependimento, expulsavam numerosos demónios, ungiam com óleo muitos doentes e curavam-nos.
Mc 6,7.12-13

A um é dada, pela acção do Espírito, uma palavra de sabedoria; a outro, uma palavra de ciência, segundo o mesmo Espírito;
9a outro, a fé, no mesmo Espírito; a outro, o dom das curas, no único Espírito
1 Cor 12,9

Algum de vós está doente? Chame os presbíteros da Igreja e que estes orem sobre ele, ungindo-o com óleo em nome do Senhor. A oração da fé salvará o doente e o Senhor o aliviará; e, se tiver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados.
Tg 5, 14-15

Senhor,
Que o vosso servo,
Ungido na fé por este Santo óleo,
Possa sentir alívio em suas dores e
Conforto em sua fraqueza.
Por nosso Senhor Jesus Cristo vosso Filho
Na unidade do Espírito Santo. Amém.
(Rito da unção dos enfermos)


Segundo o Evangelho, os apóstolos já ungiam com óleo muitos doentes e assim os curavam. Portanto, a acção dos presbíteros descrita por Tiago enraiza-se na própria acção salvífica de Jesus, através dos seus apóstolos. De facto, o óleo era um “instrumento” medicinal popularmente prestigado, sendo usado também misturado com vinho. Mas aqui não é um mero meio curativo natural: unge-se “em nome do Senhor” (fórmula já usada entre os judeus nas curas milagrosas) e é acompanhada pela oração, sendo que ambas (a oração e a unção), pelo que o versículo 15 indicia, não são dois momentos distintos mas um só acto.

Outro elemento importante é o dado de que eram os presbíteros a realizarem essa acção. Isto representa um avanço se tivermos em conta de que no Judaísmo as curas milagrosas eram realizadas por “carismáticos” com poderes curativos. Mesmo no seio do Cristianismo, na teologia paulina expressa na 2ª Carta ao Coríntios, a capacidade da cura era reservada aos que tinham recebido esse dom ou carisma do Espírito. Em última análise, verificamos aqui uma aproximação entre o carisma e a instituição, o que é um passo importante na construção da identidade da Igreja, no seu modo de entender como gerir a passagem dos dons de Deus que recebe, de modo a transformá-los em dons para os homens.

Em Tiago, a unção dos enfermos é entendida como cura corporal e cura anímica; há por isso uma interligação e interdependência entre corpo e alma: Deus cura o corpo curando a alma (dos pecados). Ao longo da evolução deste sacramento, ocorreu uma desvalorização da dimensão corporal, restringindo-se apenas a uma cura espiritual. trata-se da saúde da alma, a do corpo foi progressivamente secundarizada. Contemporaneamente tem-se descoberto a relação de grande reciprocidade entre saúde psicológica e saúde biológica. É bom que esta nova perspectiva que se está a desenvolver no campo da medicina e da psicologia invada o campo da Teologia (julgo que já invadiu, tendo-se desenrolado muita reflexão a este nível…) para lhe dar novas luzes a vários âmbitos, e, porque não, ao sacramento da unção dos enfermos. Talvez assim a Teologia descubra o seu poder poder curativo e se torne toque divinalmente aliviador.


__________

Para elaborar este texto recorri a um comentário de José Alonso à Carta de Tiago:

ALONSO, José – Carta de Santiago. (Tradução e comentário). In LEAL (dir.) – A Sagrada Escritura: texto e comentário. III. BAC : Madrid, 1967. p. 224-225.

A SEGUNDA CARTA DE PEDRO

Alguns exegetas modernos pensam que a segunda Carta de Tiago é o texto mais tardio do Novo Testamento. Schlosser e Brown por exemplo proponhem a datação da Carta a volta de 130. (cf. J. Schlosser, "La deuxième épître de Pierre", in: Introduction au Nouveau Testament, sous dir. D. Marguerat, Genève, Labor et Fides, 2001"). os motivos para justificar uma tal posição são o paralelismo entra os capítulos 2 e 3 e a Epistola de Jude (o texto é quase idêntico, a diferênça situa-se na falta de sitações dos livros apócrifos do Antigo Testamento, o que levou os exegetas a datar a 2P depois do evento que eles consideraram como a altura da fixação du cânon judeu do AT em Jamnia). Clement de Roma e Santo Ireneu de Lião nas suas obras reconhecem só uma Epístola de Pedro.
Os autores mais tradicionais pensam que o autor da Carta seria Pedro, eventualmente pela jauda de um secretário. (Podemos encontrar estas posições por exemplo na Bíblia de estudo do Semeador, ou então, in: A. Kuen, Introduction au Nouveau Testament, tome 3: les épîtres générales, Saint-Légier, Éditions Emmaus, 1996; ou en anglais: D.A. Carson/D.J. Moo/L. Morris, An Introduction to the New Testament, Zondervan, 2005).
Porque tudo este cuidado na abordagem da sagunda Carta de Tiago? Para mostrar que há de facto uma diferença fundamental entra a primeira e a segunda Carta de Pedro. A Carta mostra de facto que foi escrita pelo mesmo apóstolo (1.1) e dirigida às mesmas igrejas (3.1), mais tarde e pouco tempo antes da morte do autor (1.14).
Resumindo, a segunda Carta de Pedro é dividida em 3 capítulos:
- O capítulo 1 faz uma exortação aos "santos" em permanecer firmes na sua vocação e eleição;
- O capítulo 2 chama atenção sobre os falsos doutores;
- O capítulo 3 fala dos últimos dias e da segunda vinda de Cristo.
De facto, a Carta é um apelo às virtudes: integrar as virtudes cristãs na vida do dia a di.
Os falsos doutores já foram denunciados por Paulo as suas doutrinas já deram frutos: as tentações da carne. Os erros da doutrina levaram à corupção moral (2.3,10,14); estes também negam a vinda gloriosa de Cristo (3.3,4), ora enquanto prometem a liberade aos outros, são eles-mesmos escravos da corupção (2.18,19). Depois, o autor tenta mostrar a verade histórica do cristianismo (1.16).
Esta carta é uma apologia das virtudes cristãs: permanecer firmes na verade e nas virtudes cristãs.
Max ATANGA
Resumindo, a segunda Carta de Pedro está dividida em 3 capítulos.
- o capítulo 1

A PRIMEIRA CARTA DE PEDRO

O autor da primeira Carta de Pedro é o próprio Pedro e isto já se verifica nestas palavras: "Pedro, Apóstolos de Jesus Cristo" (1P1,1). Alguns exegetas modernas tentaram pôr em causa a autoria de Pedro, por causa do estilo sábio do grego e a falta de detalhes pessoais. No entanto, pelo seu próprio testemunho, foi ajudado por Silas (1P5,12), discípulo de Paulo. (2Co1,19; 1Tes 1, 1; Act 15,40).
Em que contexto Pedro escreve esta Carta?
A Carta foi escrita na Babilónia (provavelmente em Roma) e foi enviada aos "santos" (Asia Menor) depois do inicio da persecução dos cristãos por Nerão.
Resumindo, a Carta divide-se em cinco capítulos:
- o capítulo I fala da tarefa de Cristo como preordenação, ou seja como Redentor.
- os capítulos II e III falam de Jesus como a Pedra angular da Igreja. soublinham também a dimensão do sacerdócio real dos cristãos (o sacerdócio universal), falam de uma nação santa (capítulo II, 9-10).
- os capítulos IV e V explicam a finalidade da pregação do Evangelho aos mortos.
o que está no centro da primeira Carta de Pedro é a teologia do sofriment, ou seja, a percepção do sofrimento a partir do próprio sofrimento de Cristo. a partir daí, podemos ver que o cristianismo dá uma identidade, o ser cristão no contexto das perseguições. Assim, Jesus é o modelo dos cristãos. Esta teologia do sofrimento liga-se com a teologia paulina. A experiência cristã realiza-se no sofrimento, que é de facto a identidade cristão. Não se trata aqui de uma identidade idealizada, mas sim, de uma identidade vivida: é o fluxo da realidade.
Em conlusão, o 1P desenvolve a teologia do sofrimento. Não se trata aqui do sofrimento pelo sofrimento, mas do sofrimento como virtude, como valor. Não há cristianismo sem cruz e é esta que faz a identidade cristã.
Max ATANGA