quarta-feira

Paroikos

Uma das coisas mais apaixonantes na Prima de Pedro (vulgo: Primeira carta de S. Pedro), do meu ponto de vista, é a questão da terceira identidade dos cristãos que não são judeus nem pagãos. Os cristãos são os discípulos de Jesus, o Verbo de Deus que montou a sua tenda entre os homens (Jo 1, 14). Deste modo, julgo, não podemos buscar luz para essa identidade senão nas palavras do Jesus quando afirma não ser do mundo, do mesmo modo que aqueles que O acolhem também não o são.
Pedro abre a sua carta dirigindo-se aos eleitos estrangeiros já dispersos ou difundidos pelas províncias romanas da Ásia. A dispersão não é um tema novo, contudo, este termo, aplicado aos cristãos, reveste-se, verdadeiramente, de um novo significado. Se para os judeus a diáspora/dispersão é uma realidade posterior que olha com saudades para a terra prometida, para os cristãos, pelo contrário, é uma realidade de certa forma intrínseca, em dois sentidos. Primeiro, a dispersão é a primeira expansão da Igreja, um movimento que se deve a muitos motivos mas sobretudo ao mandato missionário do próprio Jesus. O segundo sentido, concentrado no termo estrangeiros - paroikos, certamente mais próximo às intenções do autor, reporta-se ao que acima dissemos, a nova identidade destes homens, como cristãos. Estes são estrangeiros porque discípulos de Jesus. Sendo estrangeiros estão fora das estruturas sociais às quais o cristianismo constitui uma alternativa. São marginais pela sua fé e vontade, mas ao mesmo tempo, paradoxalmente, eleitos por Deus para formarem um novo povo sob a égide de Cristo.
O cristianismo é a casa, a cidade, o país, mesmo a identidade dos cristãos. A comunidade dos eleitos constitui um povo novo, pertença de Deus apenas. O mal que antes era ser estrangeiro, paradoxalmente, torna-se o bem querido por Deus, estado de vida fecundo para a humanidade.

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