sábado

Sentimentos do coração na primeira carta de Pedro

Os texto bíblicos apontam o coração como o local onde se dá a fusão da dimensão psíquica e espiritual. É, pois no coração dos homens que Deus opera e é nele que se dá a sua transformação total. Se o homem não deixar que a acção de Deus toque o seu coração a sua conversão será sempre parcial. O homem tem de se deixar tocar tocar por Deus no seu coração, porque se Deus não tocar naquele que é o centro das vontades e paixões no homem, estas não atingirão as dimensões do amor de Deus, mas continuarão a ser paixão do homem que perecerão como perece a "flor da erva" (cf. Tg 1, 10). O desafio das obras e do amor verdadeiro são o estimulo que estão contido no coração do homem. Esta é a perspectiva que nos dá a primeira carta de Pedro, nas três vezes que encontramos a palavra coração:

1Pe 1, 22-23: "Já que purificastes as vossas almas pela obediência à verdade que leva a um sincero amor fraterno, amai-vos intensamente uns aos outros do fundo do coração, como quem nasceu de novo, não de uma semente corruptível, mas de um germe incorruptível, a saber, por meio da palavra de Deus, viva e perene."
Esta passagem da carta de Pedro apresenta-nos o coração como o local onde a palavra é transformada em verdadeiro amor. Ou melhor, como a palavra pode purificar os corações daqueles que a acolhem, podemos ainda dizer que estas palavras da carta seguem a lógica que na carta de Tiago nos é lançada em 3,14 e 4,8; onde somos chamados a não ter um coração dúbio.
1Pe 3, 3-4: "Que o vosso adorno não seja o exterior - arranjo do cabelo, jóias de ouro, roupa vistosa - mas, sim, o interior, que está oculto no coração, o adorno duradouro de uma alma mansa e serena; este é o adorno de maior valor aos olhos de Deus."
Aqui , o desafio é claro. Não nos agarremos ao corruptível, mas sim ao incorruptível, o coração é assim o local da verdadeira riqueza.
1Pe 3, 14-15: "Mas, se tiverdes de padecer por causa da justiça, felizes de vós! Não temais as suas ameaças, nem vos deixeis perturbar; mas, no íntimo do vosso coração, confessa Cristo como Senhor, sempre dispostos a dar a razão da vossa esperança a todo aquele que vo-la peça."
Nesta terceira passagem, a qual podemos identificar esta esperança a que o coração desafia os cristãos a testemunhar com paciência para vinda do Senhor, como refletimos no post anterior sobre a carta de Tiago (cf. Tg. 5, 7. 8).
Podemos dizer que a palavra coração não tem propriamente um campo semântico, mas sim um conjunto de sentidos, sentimentos, emoções e outras tantas dimensões particularmente humanas que lhe são atribuídas.

Cristãos como estrangeiros repatriados sob a pedra viva

Sendo a intencionalidade das cartas católicas a abrangência do universalismo, o reforço da coesão interna do grupo – palmilhante num mundo adverso – e a interpretação plausível do ser cristão, a primeira carta de Pedro, inscrita neste contexto, procura a conciliação tensional do cristianismo como uma alternativa crível, inscrita no mundo. Sob a autoridade de Pedro, redigida pelo punho do secretário Silvano (ou Silas), esta epístola, de tom exortativo e baptismal e de fina elegância estilística, dirige-se tanto aos cristãos da Ásia Menor como o todo o cristão, como um "pároikos" – fora da sua casa – pois o modus vivendi dos cristãos é alternativo ao dispositivo social vigente. Mas a esses despatriados, Pedro anuncia-lhe o cristianismo como uma pátria.
Mediante frequentes palimpsestos do Antigo Testamento, esta carta tem o seu epicentro em 2, 4-10, vulgarmente intitulado por magna carta do cristianismo, onde, envolta em texturas relativas à casa, Pedro, partindo de Cristo, como a pedra rejeitada pelo mundo mas preciosa aos olhos de Deus, vê os cristãos como aqueles que, à imagem de Cristo, foram pedra escolhida do novo Templo de Deus, irmanados em Cristo, onde o sofrimento, em vez de se tornar um empecilho, se transformou em motivo de alegria, pois Aquele que nos precedeu morreu por nós.

sexta-feira

A essencialidade de Estêvão

Estêvão, o chefe dos Sete, é o “enfant terrible” que agita a bonomia de Jerusalém com discursos retumbantes. Agitado pela força do Espírito, a sua voz é fogo e ninguém consegue resistir às suas invectivas. Ainda neófito e como helenista de grandes rasgos, havia percebido que a Igreja não era um “gueto” de Israel, que o verdadeiro Templo de Deus não era uma construção, mas todo o Povo de Deus que tinha fé em Jesus e que a salvação não advinha da lei judaica mas da fé em Jesus Cristo. Perante tais intuições, a sua boca, mesmo em perigo de ser esboroada, proliferava tal Boa-nova e isso valeu-lhe a morte e, consequentemente, a perseguição à Igreja, mas foi graças à essencialidade de Estêvão que a Igreja se abre ao mundo, que de judaica se abraça ao mundo pagão. A corporeidade de Estêvão foi liquidada mas o seu espírito sobrevive ainda embrionariamente no jovem carrasco de nome Saulo, que será o grande continuador da obra começada por Estêvão.
Desta forma se percebe a importância, ao longo dos Actos, da figura do “enfant terrible”.

Uma circular às doze tribos da diáspora

Imbuído numa herança veterotestamentária e familiarizado com os clássicos gregos e com a retórica dos cínicos e estóicos, Tiago, o autor da epístola, ou melhor, da circular, procura, com um cunho didáctico e moral, sem uma aparente organização temática, apelar os cristãos a viverem em espírito cristão num mundo por vezes adverso.
Trata-se sobretudo de uma circular, dadas as sucessivas elaborações parenéticas sobre a vida na comunidade e no mundo, onde se prescinde do elemento específico da saudação inicial e completamente da saudação final, que na antiguidade definiam uma epístola, pois o corpo da mesma era ladeado por orações, votos, notícias pessoais e saudações. No entanto, a preocupação de Tiago era diferente, pois pretendia abranger sobretudo os judeu-cristãos da Diáspora.
A nível de conteúdo, esta circular de fina expressão, cheia de embelezamentos estilísticos, assenta em sete andamentos, em ritmo binário, a saber, ditos sobre a sabedoria e a resistência, ditos sobre a escuta da Palavra e a recta acção, parénese sobre a acepção de pessoas e sobre a fé e as obras, ditos sobre a língua e o falar apropriado, ditos sobre a inveja e a discórdia e, por último, ditos sobre o abuso dos ricos e a paciência.

a Epístola de palha?

Durante a Reforma, alguns teólogos, como Martinho Lutero, argumentavam que a epístola de Tiago não deveria integrar o cânone do Novo Testamento, devido à controvérsia entre a "justificação pelas obras", ali contida, e a "justificação pela fé" pregada nas cartas paulinas. Lutero via aí uma contradição com a doutrina da sola fide ("somente pela fé"). Esta epístola difere de todas as outras epístolas do Novo Testamento por não tratar de assuntos como: salvação, Igreja, Espírito Santo, vida futura, etc., e por isto tudo Lutero chegou a chamá-la “epístola de palha”.
Na verdade o argumento da "justificação pelas obras", desenvolvido por Tiago (2,14-26), pode ser contrastado com a doutrina da "justificação pela fé", defendida por Paulo em suas epístolas. Mas qualquer suposto conflito doutrinário entre esta carta e a de Romanos parece não ter qualquer fundamento. A pregação de Paulo nesta carta tem de ser vista como defesa perante a posição dos chefes das esferas do judaísmo nas igrejas em questões da lei e do templo, dando naturalmente grande ênfase à justificação pela fé sem necessidade da observância da lei. Todavia, quando ele escreveu a Tito, o tema principal de sua carta foi: a importância das boas obras (Tt 2, 7-8), mostrando deste modo uma perfeita harmonia com os ensinos de Tiago. Em Ats 26,20, Paulo diz que ele tem pregado “o arrependimento e a conversão a Deus, com a prática de obras dignas desse arrependimento”, outra passagem que demonstra que Paulo concordava com Tiago em que a fé verdadeira (ou "viva") é acompanhada de obras. Por outro lado, os padres da Igreja conciliavam as duas posturas vendo que a fé salvadora e verdadeira é a que pelo amor é acompanhada de boas obras, por oposição à fé que é apenas uma adesão intelectual a um conjunto de verdades reveladas. É evidente que Tiago, quando parece depreciar a fé, se refere apenas ao assentimento intelectual da verdade e não à fé salvadora a que se refere Paulo.

ESPERANÇA EM 1 PEDRO 1,3

Em 1Pe 1,3 aparece a palavra esperança unida à palavra viva:

“Bendito seja Deus, Pai do Nosso Senhor Jesus Cristo, que na sua grande misericórdia nos gerou de novo através da ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos para uma esperança viva”.

Pedro nesta passagem descreve o termo regeneração mais exactamente como esperança, pois a nossa salvação é todavia futura., já que a exortação à perseverança e a uma vida moral, como podemos ver mais atrás em 1,13ss, faz-nos ver que não se trata de um bem puramente escatológico.
Esperança viva, é dizer, que não engana, como podemos ver em Rom 5,5, apenas conduz à vida eterna (Tit 1,2; 3,7). O ritmo do versículo 3-5 exige relacionar a ressurreição de Jesus Cristo com a regeneração e não exclusivamente com a vitalidade da esperança.
Podemos pois concluir que a relação da ressurreição de Cristo com a nossa santificação não se deve reduzir a uma mera causalidade exemplar como paradigma da nossa ressurreição.

quinta-feira

paroikos/oikos =descoberta

Paroikos designa um estrangeiro, e oikos tem o sentido de casa. Paroikos são aqueles que vivem fora das suas casas, terras. O paroikos é visto como quem não tem lugar permanente. Potanto, Pedro que Jesus seja anunciado não só aos residentes mas também aos estrangeiros. Pedro pretende universalizar o seu projecto eclesiológico, quer romper com as fronteiras. Oikos = a casa aparece como lugar familiar, onde se possa tratar dos assuntos importantes, além de ser também lugar de partilha...O cristianismo também vai se entender a partir de casa. Pedro vê também o cristianismo como estrangeiro, ele parece não ter residência neste mundo, parece que ninguém o compreende. O outro termo que também descreve o mundo do cristianismo é parapidemos. Esta palavra designa pessoas que estão num lugar provisoriamente. É dentro desta lógica que Pedro também exorta os seus irmãos por serem estrangeiros, peregrinos. Assim os estrangeiros começam ganhar autonomia, e identidade de serem pessoas. Pedro tem uma eclesiologia de integração e não de exlcusão.

Uma alegria que permanece...

A palavra Alegria é de facto fundamental na edificação do cristianismo das origens, o cristianismo pós-pascal.
Foi assim no princípio como ainda hoje ouvimos: “enquanto os abençoava, afastou-Se deles e foi elevado ao Céu. Eles prostraram-se diante de Jesus, e depois voltaram para Jerusalém com grande alegria” (Lc 24, 51-53).
Assim o vemos no sentido de alegria indicado na I Carta de Pedro, alegria que não teme qualquer adversidade, porque sabe que configurando-se com Cristo nos sofrimentos também se configurará com Ele na Glória. Uma a alegria em sentido divino…
É esta Alegria que nos anima Hoje, neste tempo da espera…
“Exultemos de alegria, adoremos o Senhor: da Virgem Santa Maria nasceu Cristo, o Redentor!”

A alegria na carta de Tiago

Em Tiago, a palavra Alegria também está presente mas com diferentes sentidos.
Em Tg 1, 2 tem o mesmo significado que na I Pe: é a alegria que vem de suportar pela fé os mais variados sofrimentos que são infligidos.
Em 1, 8 já aparece com o sentido mundano, como sentimento vão, afastado de Deus, efémero, próprio de quem anda equivocado. É preciso humildade e chorar o próprio pecado: daí que seja necessário a alegria converter-se em tristeza.
O verbo Alegrar-se aparece também em Tg 1, 1 na saudação epistolar que abre a sua carta. Alegrai-vos é uma forma de saudação que também encontramos em vários textos do NT.

Os dois termos bíblios de Alegria

O termo Alegria na Tradição Bíblica é normalmente designado por agaliomai, que significa Alegria em sentido religioso; cairw é a alegria em sentido profano. Mas nem sempre é assim, pois depende do contexto. O sentido real tem que ser deduzido do ambiente circundante. Mas afinal qual será o sentido de Alegria presente na I Carta de Pedro?
A ideia de Alegria no sofrimento está já presente no judaísmo. Disto é testemunha a Literatura Sapiencial. As provas são instrumento da pedagogia de Deus, que prova os eleitos. O sofrimento vem dos tormentos que se sofrem pela fé e dela dá testemunho. Assim as provações tornam-se ocasião de alegria.
É esta alegria em sentido religioso, de quem suporta os sofrimentos em nome da fé, que encontramos na I Carta de Pedro (cf. I Pe 1, 6). Por isso é preciso fazer o bem com paciência, pois isso é meritório aos olhos de Deus (I Pe 2, 20-24), suportando o mal com o bem.
Há uma conexão entre alegria e dor, alegria e sofrimento, muito presente no NT. Em I Pe 4, 12-14 o fundamento da alegria no sofrimento é posto em Cristo, que também sofreu e agora está na glória: nós alegramo-nos na medida em que participamos dos seus sofrimentos. Assim também nos alegraremos “na altura da revelação da sua glória” (I Pe 4, 13). Aqui está presente também o elemento escatológico que acentua o sofrimento pela fé como alegria em vista da parusia.

ALEGRIA

A palavra que escolhi para acompanhar o estudo da Carta de São Tiago e da I Carta de São Pedro é a palavra ALEGRIA, juntando-se a ela o verbo alegrar(-se). A Alegria aparece em Tiago 1, 2 e 4, 9 e na I Pedro aparece em 1, 8. O verbo Alegrar aparece em Tiago 1, 1 e I Pe 4, 13. O cristianismo das origens colide sempre com a realidade que encontra, há um impacto vital: assim foi numa primeira época com o judaísmo, numa segunda com o helenismo, e numa terceira com o Império Romano. Perante os impactos, a atitude dos cristãos deve ser a alegria, em todas as situações, mesmo nas mais adversas. A isso exortam as Cartas visadas neste estudo. O cristianismo nascente tem que ser marcado pela alegria, sob o risco de sucumbir ao desânimo.

Pode um estrangeiro ser livre?

Toda a estranheza provoca um mal-estar (ou um estar sem jeito) pelo pressentimento íntimo daquele desfasamento que nenhum gesto poderá ocultar (por melhor que seja a mímica). Mais: a estranheza embaraça, colocando sob ameaça o estranho, tal o risco da proscrição. Porém, não será que há uma certa estranheza que surge, precisamente, do facto de se ser livre? Não será todo o liberto um estranho? um desfasado? um vago ciente da sua atopia (porque habitante dessa – saudosa – terra sem chão)?
Ocupar-nos-emos, então, brevemente, do eleutério conceito (no quadro da primeira Carta de Pedro – 1 Pe 2,16), tendo como pano de fundo a tensão que todo o estrangeirado conhece, que é a de ser um deslocado desperto para aquele outro local que a saudade invade.

O PRISIONEIRO EM ROMA

Dois anos depois da crucificação de JESUS CRISTO, Saulo de Tarso, o fanático perseguidor dos Cristãos, converteu-se ao Cristianismo (Actos 9, 3 e seguites.) Quase precisamente trinta anos depois, fez o grande catequista e propagador da doutrina de JESUS a sua verdadeira viagem, desta vez como prisioneiro.
Portanto, a Judeia, desde o ano 61, o procurador FESTO, que mandou Paulo, gravemente acusado por Jerusalém, a Roma, na companhia do centurião chamado Júlio (Actos 27, 1). Ali, autorizaram Paulo o que ficasse onde quisesse com um soldado a guardá-lo (Actos 28,16).
"Paulo permaneceu dois anos inteiros no alojamento que alugara, onde recebia todos os que iam procurá-lo, anunciando o Reino de Deus e ensinando o que diz respeito ao Senhor Jesus Cristo, com o maior desassombro e sem impedimento" ( 28,30-31).
Com estas palavras conclui S. Lucas o seu livro dos Actos dos Apóstolos. Por outro lado, S. Paulo morreu martirizado durante a perseguição aos cristãos, que começou com Nero. Em suma, como era cidadão romano, não morreu numa CRUZ, como S.Pedro, mas passado o fio de espada.

O Legado de Pedro

Se atendermos a que a primeira carta de Pedro deveu ser escrita antes de sua morte, podemos enquadra-la num período abrangente entre os anos 64-67 d.C. Historicamente no ano 64 d.C., a cidade de Roma foi devastada pelo fogo. Nero, o imperador na altura, acusou um grupo de pessoas que já eram mal vistas pelo público em geral porque não prestavam culto aos deuses romanos e por isso eram consideradas ateias. A escusa era extremamente fácil: o incêndio de Roma era um castigo dos deuses porque alguns não lhes prestavam culto. Nero perseguiu os cristãos veementemente e com apoio popular.
O apóstolo Pedro escreveu sua primeira epístola durante este período. Ele entendia que muitos cristãos iriam enfrentar severa perseguição. Seu propósito nesta carta era advertir aos destinatários contra a tribulação iminente e encorajá-los a permanecerem fiéis durante esses tempos difíceis. O que pessoalmente me admira de esta carta é que ultrapassa este contexto histórico, isto porque todos os cristãos de todos os tempos vivem de uma ou outra maneira as mesmas dificuldades para serem testemunhas de Cristo contra a corrente do mundo e da sociedade, e hão de viver, como descreve a carta, como verdadeiros peregrinos, forasteiros de este mundo. Neste sentido vejo esta carta como um verdadeiro legado deixado pelo apóstolo que encoraja alicerçado na certeza da Ressurreição de Cristo e alimentando a esperança da glória futura, a todos os cristãos a serem fieis e coerentes com a nova vida que abraçaram e a considerar motivo de alegria a provação e a perseguição á semelhança do Mestre. Estas palavras terão especial autoridade porque serão seladas com o próprio martírio do apóstolo.

quarta-feira

A parusia na carta de Tiago

Como estamos em tempo de Advento, nada melhor que reflectir sobre o que nos diz a Carta de Tiago sobre a vinda do Senhor.
Encontramos 2 referências à parusia (vinda) na carta de Tiago. Em Tg. 5, 7 «Sede, pois, irmãos, pacientes até à vinda do Senhor.» e em 5, 8 «Sede vós também pacientes e fortalecei o vosso coração, pois a vinda do Senhor está próxima».
Tiago manifesta na sua carta a preocupação de preparar os seus «irmãos» para a vinda do Senhor.
Aqui, a ideia da parusia está ligada à ideia da espera na paciência. A exemplo do camponês que espera pelo fruto da terra com perseverança, aqui importa aguardar com paciência, vivendo com os olhos fitos na vinda do Senhor. A bela imagem do agricultor que espera com confiança a chuva temporã é a imagem que o autor utiliza para que também nós esperemos com confiança e perseverança.
Neste capítulo percebemos que a ideia de uma vinda próxima estava muito presente para os primeiros cristãos. Percebemos isso porque Tiago exorta à confiança e perseverança na paciência ao afirmar: «porque a vinda do Senhor está próxima.»

Acerca da carta de Tiago

A sua canonicidade só foi totalmente aceite no ocidente a partir do século IV. Quanto ao autor a tradição aponta para Tiago o Menor. O autor seria um judeu convertido atestado pelo vasto conhecimento do Antigo Testamento. A data mais provável da sua redacção é antes de 62, ano da morte de Tiago. A epístola é dirigida aos judeus da diáspora convertidos ao cristianismo. Os temas principais de que trata são sobretudo de ordem moral: as tentações, a fé sem obras está morta, avisos contra a “má-língua”, discussões e o “espírito do mundo”, fala ainda da importância da caridade e da confissão dos pecados.

Resumo da 2ª Pedro

A segunda carta de S. Pedro começa (1,1-2) também com um endereço e uma bênção, de seguida (1,3-21) há uma exortação a levar uma vida cristã, depois fazem avisos contra os falsos doutores que negam o Senhor e o regresso de Cristo e por fim, uma conclusão (2,1-3,17). Quanto a esta carta ser de Pedro existem poucas certezas, Origenes e S. Jerónimo defendem a sua originalidade, no entanto nada é certo. Entre primeira de Pedro e a segunda existem muitas diferenças ao nível do vocabulário, língua, estilo e doutrina. O ambiente da carta aponta para uma época mais tardia para a composição desta epístola. Entre esta carta e a de Judas existem parecenças, o que leva a equacionar se o autor não é o mesmo. Esta carta sublinha sobretudo a importância da fé e de precaver-se contra os falsos profetas.

Sintese da 1ª Pedro

A primeira carta de Pedro está composta, numa primeira parte (1,13-3,12) por um endereço, com saudações, um bênção e uma palavra acerca da honra de fé cristã, depois temos uma exortação a viver em Cristo e sobre a vida social dos cristãos no mundo. Em seguida (3,13-4,18), ainda em tom parenético faz um convite a imitar Cristo, pois ele é consolação no sofrimento o qual faz parte da vida cristã. Por fim termina com avisos e uma bênção final.
Pelo estilo e pelas influências e contexto que dela ressalta podemos dizer que foi escrita antes de 64, mas não é certo que pelo próprio S. Pedro, talvez pelo seu companheiro Silvano. Quanto ao local onde pode ter sido escrita a própria carta nos dá uma pista, provavelmente Roma (“Babilónia”). Quanto à doutrina o aspecto que mais ressalta é o carácter profundamente escatológico da carta, toda a carta está marcada pelo final do tempo o qual dá sentido aos sofrimentos actuais, qual dá sentido ao facto de serem paroikos. Este último facto é muito importante porque o cristianismo das origens apresenta-se como alternativa ao judaísmo e ao paganismo. O cristianismo como novo Povo de Deus constrói-se nas franjas da sociedade. Os seus pais são o judaísmo e o helenismo, aspecto que ressalta muito desta carta.

terça-feira

Primeira Carta de Pedro e o tema da liberdade

Os cristãos, que são identificados com Cristo, agem criticamente. Deste modo, podem não
apenas resistir aos sofrimentos como ainda amar os opressores.
É essa insólita disponibilidade interior para a submissão (enquanto momento desconcertante de anúncio) que distingue o ser cristão. Esse é, profundamente, o segredo da sua liberdade, que lhes permite viver como forasteiros e hóspedes nessa terra alheia que é a da lonjura de Deus…
Porventura, a estranheza por que se acham sem-terra é menos espacial do que cordial, identificada que está com esse horizonte sem chão… Enfim, no limite, é a liberdade que os faz estranhos…

A cegueira de Barjesus, o mago


Podemos dizer que a sentença que Paulo faz ao mago, consciente do seu mandato apostólico e da presença do Espírito, torna-se prova evidente do poder irresistível do Senhor.
O mago cego, que se encontra na escuridão, transforma-se em símbolo das trevas, que se abatem sobre aqueles que se opõem à oferta da salvação e que impedem aos outros de encontrar a salvação que tantos procuram.
Já o procônsul impressionado pelo “sinal” representa todos aqueles que aderem à mensagem de Cristo, acolhem o seu projecto de salvação, que abraçam a fé.
Barjesus apresenta-se como um adversário ao projecto divino, obstáculo à adesão dos pagãos à novidade do cristianismo. O seu verdadeiro pai espiritual é o diabo, o pai da mentira (cf. Jo 8,44).
Portanto, Paulo quando dirige a palavra a Barjesus cheio do Espírito Santo em 13,10, depois de fitar os olhos nele, chama-o de bar-diabo, “filho do diabo”, em vez de Barjesus, porque é inimigo de toda a justiça, entorta os caminhos rectos de Deus (cf. Os 14,10) e conduz os homens ao erro.
Em suma, podemos pois concluir que Paulo invocando a mão poderosa do Senhor faz com que o mago, enraizado já na sua cegueira interior, fique cego por um tempo sem que ele veja a luz do sol. Por conseguinte, o procônsul ao ver isto abraçou a fé, surgindo nele a partir daquele momento uma luz interior que apagou toda a obscuridade.


segunda-feira

A fé como acto e possibilidade relacional

Tiago é um autor que abarca nos seus escritos várias realidades existenciais. por ex. o relacionamento entre as comunidades, as difculdades diárias... em Tiago podemos encontrar essa lógica de que ser cristão é agir, este agir deve possibilitar um crescimento relacional. A experiencia da fé cristã não está fora da experiência humana. a fé leva o ser humano agir e julgar. ser cristão significa ler os sinais da vida à luz de Cristo; e Tiago é claro no seu discurso, ele quer uma fé activa, atenta. Em Tiago temos também uma dimensão exortativa. Nele encontra-se uma pedagogia social, esta pedagogia social tem a ver com a prática profunda dos fiéis, esta pedagogia remete-nos para afirmação identitária da própria comunidade. os fiéis são convidados a serem fieis, a fidelidade tem a ver com a afirmação da própria fé e também reconhecer Deus como o verdadeiro juiz. Em Tiago encontramos essa relação entre fé e acção. Ou seja, não ha fé sem acção nem acção sem fé. O cristão é aquele que lê os sinais de Deus em sitauções concretas da sua vida

O eunuco convertido pela Palavra


Este personagem do livro dos Actos não deixa de ser uma das personagens mistério de todo o livro. Este personagem enigmática, o qual não se sabe o nome, apenas que era funcionário da rainha Candace da Etiópia, e que tinha ido em peregrinação a Jerusalém, acaba por ser convertido e baptizado por Filipe no caminho. Isto é algo, que no desenrolar da intriga nos deixa perante alguma perplexidade. Qual terá sido a intenção de Lucas ao apresentar-nos este pagão? Dá-nos a indicação de que ele era interessado seja pelas peregrinações a Jerusalém, seja pelas escrituras, pois ele ía lendo o profeta Isaías no caminho. É pois, este interesse e curiosidade pela palavra que será o ponto de encontro com Filipe e a sua futura conversão.

Mas porque apresentará Lucas este "sem nome"?

Lucas, com este personagem, procura mostrar que Jesus vem para todos. Portanto, este "sem nome" é um personagem colectiva e sua adesão ao Cristianismo concretiza a intenção de Lucas, Jesus vem para todos, estejam onde quer que estejam. É de se salientar também o facto de estarem a caminho e de continuarem a caminho. Isto significa o caminho a fazer, seja antes ou seja depois.
Pedro, Apóstolo de Jesus Cristo

Embora Pedro seja apresentado como o autor deste escrito pastoral composto certamente em Roma (1Pe 5, 13: Babilónia = Roma; cf. Ap 17, 5) poderia muito bem ser Silvano (Silas), discípulo de Paulo, que esteve em contacto tanto com os destinatários deste escrito, no ambiente missionário micro-asiáico paulino, como com Pedro. A elaboração da primeira “epístola de Pedro” de ter acontecido nos últimos decénios da idade apostólico (cf. Alfred Läpple, BIBLIA, Interpretação, Actualização e Catequese, Vol. 3, NT, São Paulo, Ed. Paulinas, 1980, p. 239).
Pedro dirige-se aos cristãos que vivem em várias partes da Ásia Menor, os quais estão sofrendo rejeição no mundo devido à sua obediência a Cristo (4.1-4, 12-16). Ele, portanto, relembra-os de que têm uma herança celeste (1.3-5). Embora esses cristãos vivem fora da sua morada (casa – oikos), elas são casa, são pedras vivas que vivem em Cristo (2, 4-5). A ideia de casa dava a identidade da pessoa no mundo antigo. Os cristãos nos quais Pedro dirige esta carta são paraikos (forasteiros, fora de casa, estrangeiros). O cristianismo constrói-se não a partir de casa; é um paradigma alternativo do mundo de então.
Qual é a função desta Carta de Pedro? a) função identitária, ou seja, reafirma a identidade da comunidade; b) reforçar a coesão de grupo (comunidade); c) dar uma interpretação plausível de como é possível ser cristão num contexto de diversidade.
A igreja sabe a sua identidade quando olha para Cristo. Não há discurso eclesiológico sem o discurso cristológico, ou seja, Cristo é a base da vida da comunidade.
A primeira Epístola de Pedro é um dos escritos parenéticos do NT em que não se desenvove o querigma, mas do querigma de Cristo já conhecido tira-se as consequências ético-religiosas.

Arlindo S. Tavares
TIAGO, irmão De Jesus

A Epístola de Tiago, definida por Martinho Lutero como “carta de palha”, nos últimos tempos foi objecto de um juízo sempre mais crítico; mais ainda, chegou-se a avançar a hipótese de que se trate de um escrito originariamente judaico, que sofreu uma “cristianização” que não podem ser redactores da epístola nem o apóstolos Tiago, que Herodes fez decapitar (Act 12,2), nem Tiago “irmão do Senhor”, que era o chefe da comunidade primitiva de Jerusalém e foi apedrejado no ano 62 d. C. (cf. Alfred Läpple, BIBLIA, Interpretação, Actualização e Catequese, Vol. 3, NT, São Paulo, Ed. Paulinas, 1980, p. 233).
A epístola de Tiago “não é verdadeira epístola, mas uma espécie de livro de sentenças, próximo do género literário que imita os livros sapiências vetero-testamentários”(J. Blinzler).
Na Carta de Tiago a referencia a Jesus é uma realidade escassa. Só duas vezes cita o nome de Jesus (1, 1; 2, 2, 1) e propõe como paradigma apenas figuras do antigo testamento, como por exemplo: Abraão, Jacob, Raab, Elias.
Começando no primeiro versículo e continuando por toda a carta, Tiago reconhece a autoridade de Jesus, referindo-se como “servo”, ou escravo, do Senhor. O termo é aplicável a todos os cristãos, pois todos os verdadeiros discípulos de Cristo reconhecem sua soberania sobre suas vidas e se comprometem espontaneamente a seus serviço.
De considerável interesse é o paralelo próximo entre o conteúdo dessa carta e a doutrina de Jesus, especialmente o Sermão da Montanha. Embora Tiago não cite exactamente nenhuma declaração de Jesus, há mais reminiscências verbais da doutrina do Senhor nesta carta do que em todo o resto das epístolas combinadas no NT. Essas alusões indicam uma associação próxima entre Tiago e Jesus e evidenciam a forte influência do Senhor na vida do autor. Contudo, no conjunto do NT esta Carta é uma pérola. Por isso, é de questionar como é possível um familiar próximo de Jesus escrever esta carta (?)
Há alguns aspectos importantes a destacar nesta Carta:1. acolhimento da sabedoria do alto; 2. a questão da fé e obra; 4. mais do que uma ortodoxia há para Tiago uma práxis; 4. apelo á oração.
“O juízo de Lutero em não considerar a Epistola do apóstolo...é provocado pelo confronto com a Epístola aos Romanos e não faz justiça à carta”, como sublinhou W. Michaelis. Por sua vez, F. Hauck acrescenta que a Epístola de Tiago constitui “um complemento válido às ideias de Paulo sobre a justiça de fé”.

Arlindo S. Tavares

domingo

Pedro. Projecto de integração e de aceitação da diferença.

Queria ver aqui a evolução do personagem, a começar no pescador, um homem instalado na vida até ao pregador da palavra, um homem sem familia sem pátria...
O que leva Pedro a deixar tudo em troca da solidão da angustia e da morte?-A busca da perfeição e da fé.
Pedro dos Evangelhos chora da sua incapacidade de optar por Jesus. Nos Actos encontramo-lo como um homem "maduro" nas suas convicções e na fé, um homem livre, aberto, diferente-componentes que assemelham-no à Jesus e proporcionam-lhe o mesmo fim.
Assim chegamos à nossa questão da integração/ligação/diferença.
O diferente é sempre uma ameaça, uma instabilidade-tem de ser eliminado (apartado/ignorado...).
Aqui não vamos falar da cor da pele, cabelos ou olhos. Trata-se de algo no fundo da pessoa que a torna diferente incopreensível para os outros e incapaz de compeender os outros. Tendo este "algo" dentro não consegue, por muito que quer, voltar a ser como era. A única coisa que lhe resta é tentar descobrir este "algo" (não é capaz de fazer outra coisa). A integração, por isso, é a união com este "algo" desconhecido que eminentemente conduz à desintegração com o mundo...
Penso que a relação de Pedro com o mundo chega por fim e este estado. Nisto assemelha-se a Jesus-o mundo odeia-o e ele é um estranho neste mundo.