quinta-feira
"Mayday". Daqui Tiago. "Boots" mudar o mundo.
Em retórica bem pensada, Tiago, na sua epístola, procura alertar a comunidade cristã para que vigie sobre si própria, no sentido de uma fidelidade a Deus. Que aquilo em que acreditam se manifeste nos seus actos: uma ortopraxis voltada para a ética e justiça social. Possivelmente escrita no final do século I, dirige-se às Doze Tribos, sendo que, mesmo sabendo que pode ser a diáspora toda, é também cada comunidade da diáspora. A falta de atenção aos pobres, o decréscimo da importância da Palavra na comunidade e a pouca expressão de comunidade fraterna dentro da Igreja, irrita solenemente Tiago e impeli-o a despertar as ekklesiai mais relaxadas. Sente-se uma saudade tipológica da comunidade de Jerusalém, como referência de mudança. É o cristianismo que lentamente ergue novo.
Uma casa onde todos sofrem e riem de alegria
É sabido que o sonho de O Chefe de Estado é conseguir angariar o maior número possível de forasteiros, desalojados, peregrinos, [refugiados não, porque isso dá status na ONU]… enfim, gente sem pedigree. Tão non sense como este Presidente tónhó, Pedro parece ter uma fixação por esta gente cuja vida parece um falhanço. E não é para menos. Gente que vive fora da pátria, fora de casa, perseguida por ser um je ne sais quoi, invoca bem a figura do Homem diferente de Nazaré.
Pedro, na sua primeira carta, em registo meio litúrgico meio exortativo, entusiasticamente, tece um louvor justificativo à condição desalojada dos cristãos dispersos. Apelando à justiça, reúne em casa os que participaram da ressurreição de Jesus. A alegria surge como resposta natural e paradoxal ao sofrimento. Noutro registo, o autor da II Carta de Pedro, pela solenidade do apelo à virtude, e numa apresentação de um esboço de compreensão do corpus bíblico, purifica o comportamento dos irmãos condenado uma possível gnose descomprometida. Em jeito de testamento espiritual, prepara a posterior memória de uma comunidade que se constrói.
quarta-feira
Paroikos
Pedro abre a sua carta dirigindo-se aos eleitos estrangeiros já dispersos ou difundidos pelas províncias romanas da Ásia. A dispersão não é um tema novo, contudo, este termo, aplicado aos cristãos, reveste-se, verdadeiramente, de um novo significado. Se para os judeus a diáspora/dispersão é uma realidade posterior que olha com saudades para a terra prometida, para os cristãos, pelo contrário, é uma realidade de certa forma intrínseca, em dois sentidos. Primeiro, a dispersão é a primeira expansão da Igreja, um movimento que se deve a muitos motivos mas sobretudo ao mandato missionário do próprio Jesus. O segundo sentido, concentrado no termo estrangeiros - paroikos, certamente mais próximo às intenções do autor, reporta-se ao que acima dissemos, a nova identidade destes homens, como cristãos. Estes são estrangeiros porque discípulos de Jesus. Sendo estrangeiros estão fora das estruturas sociais às quais o cristianismo constitui uma alternativa. São marginais pela sua fé e vontade, mas ao mesmo tempo, paradoxalmente, eleitos por Deus para formarem um novo povo sob a égide de Cristo.
O cristianismo é a casa, a cidade, o país, mesmo a identidade dos cristãos. A comunidade dos eleitos constitui um povo novo, pertença de Deus apenas. O mal que antes era ser estrangeiro, paradoxalmente, torna-se o bem querido por Deus, estado de vida fecundo para a humanidade.
O Homem que não pode morrer
Quando ao mentir sobre a sua vida quiseram retirar a sua dignidade o seu rosto não se aparentava senão com um anjo. Estêvão é um homem com sabedoria pois conhecia a escritura e o seu sentido pois não a lia de modo aleatório ou fragmentário mas dando-lhe um sentido. Tem em si a coragem para afrontar os sacerdotes. Ele apresenta-se como profeta para aqueles que o acusavam, e pede o salto que outros conseguiram dar para coisas que pareciam pouco possíveis de acontecer.
Mas aqueles que reconheceram o seu rosto como o de um anjo(6,15), não reconhecem que a sua mensagem(7,53).
Este homem está por Deus pois é o próprio Deus que se lhe oferece a ver.
Estêvão acaba por neste texto dos actos revelar a presença de Paulo contra os cristãos. Mas mesmo apedrejado confiava no Senhor e permanece misericordioso como o seu Senhor.
Não pode morrer, somente pode descansar dos trabalhos da sua paixão, pois o céu lhe será atribuído como justiça.
O relato da eleição de Matias (Act 1, 15-26), para ocupar o lugar deixado por Judas, é, na sua globalidade, um bom exemplo da estratégia teológico-narrativa de Lucas.
O texto inicia-se com o discurso de Pedro a uma assembleia de cento e vinte irmãos que, ali, se encontrava reunida. É logo aqui que encontramos os primeiros traços da estratégia de Lucas. A comunidade é hierárquica, dirigida pelos apóstolos entre os quais se destaca, claro, Pedro. Facilmente se estabelece uma relação de paridade entre o número de irmãos presentes na assembleia e o número das tribos de Israel – cento e vinte irmãos, doze tribos. Esta ideia é ainda reforçada quando Pedro faz uma releitura do Antigo Testamento à luz dos acontecimentos presentes, relacionados com a traição de Judas e com o subsequente desenlace da sua história.
Há quem afirme que o narrador se serve de lendas que já correriam acerca da morte do traidor. De qualquer forma, e introdução dos dados acerca da morte de Judas, como uma realidade do conhecimento geral, assim como as referências topográficas é uma forma de dar força ao discurso, prólogo do que adiante acontecerá. Este primeiro grupo é o que há-de receber o Espírito no Pentecostes. Acontece, contudo, que o grupo dos apóstolos não está completo. Assim, servindo-se dos textos proféticos e dos salmos, Pedro pretende guiar a assembleia para uma decisão, o seu discurso é, senda que liga a história de Israel à história da assembleia reunida, visa a eleição, por parte de Deus, de um homem que venha completar o grupo, nos moldes deixados por Jesus.
Numa dinâmica que articula a acção divina e humana, a comunidade, segundo as linhas traçadas por Pedro, escolhe dois candidatos. Estes, homens rectos e justos, acompanharam Jesus desde o baptismo de João até à sua morte, sendo testemunhas da sua ressurreição, são José, chamado Barsabás, apelidado Justo e Matias. Deus cujo juízo é justo, por meio da sorte, elege Matias.
O narrador segue duas linhas no seu relato, a primeira é a do próprio relato e a sua história, a segunda a teologia por trás do relato. Neste texto, a imagem que transmite da comunidade, não se realçam as diferenças entre o povo da Antiga e o da Nova Alianças, é certo que, interiormente, se identificam as distinções mas, não é esse o objectivo do autor. O relato visa a unificação e a herança comum, prova disso é o próprio uso, num texto redigido em grego, de termos hebraicos e da sua subsequente tradução. Há pontes que tem que ser estabelecidas em dois sentidos. O primeiro é, certamente, o reportar a assembleia a Jesus. Este ponto é fulcral porque garante uma identidade. Os apóstolos são o vínculo directo entre Jesus e a assembleia, por isso a escolhe do substituto de Judas só pode ser levada a cabo por Deus, sem contudo ser alheia à comunidade. Assim, também, compreendem-se cabalmente as condições da escolha. O segundo é a inserção da nova comunidade na história do povo de Israel, arriscamos, na história da salvação que não acaba com a consumação da Antiga aliança, mas que se abre ao mundo.
A casa sofrida dos Paroikoi
Os Paroikoi, aos quais é destinada a primeira carta de Pedro, dão-nos a informação de que o cristianismo nascente dá-se de modo exterior à sociedade de então. Esta "falta de casa" como o próprio nome indica acaba por ser o que lhes concede a identidade. Aqui entra a pessoalidade como algo especifico deste grupo e que torna possível o individual, pois cada um pode ser o testemunha. A pedra que é rejeitada por tdos pode valer, porque Deus a faz valer.
A casa dos cristãos é topos e ethos porque Cristo a constitui assim e se não estão em Cristo não fazem parte desta casa, trata-se aqui de perceber o que é estar “em Cristo” 5,14.
A realidade do sofrimento era algo que estava presente nos paroikoi, devido às perseguições e mesmo ao seu estado marginal e obviamente no que se refere ao pecado.
Cristo aparece para os cistãos como modelo (4,1), e este sofrimento é apresentado paradoxalmente como uma experiência de graça e de Salvação (1,6-9).
Estes sofrimentos eram vividos na expectativa de da glória (1,11 e 4,13).
Em verdade o sofrimento descrito e proposto na 1ª carta de Pedro é a realidade que concede coesão aos paroikoi, pois orientando o seu sofrimento para o Senhor concedia-lhes força e coesão. O Espírito Santo seve-se destas realidades conflituosas e ofensivas para nos irmanar.